Liturgia e Homilia na Quarta-Feira de Cinzas 2021
1. Este é o primeiro dia da Quaresma, início da nossa subida, com Cristo, a Jerusalém (cf. Mt 20,18), para celebrarmos juntos a Sua Páscoa gloriosa. Mas este não é, para ninguém, o primeiro dia de uma renovada quarentena, decretada pelo Estado, por razões de saúde pública, em sucessivos estados de emergência. A pandemia do coronavírus transformou, de facto, a nossa Quaresma litúrgica de 40 dias num ano de quarentena sanitária. Cabe-nos a nós transformar esta quarentena sanitária em Quaresma de salvação e os dias de confinamento em tempo de graça, isto é, em ocasião favorável de conversão e de renovação da fé sincera, da esperança viva e da caridade ativa!
2. Na verdade, “pelo segundo ano consecutivo, celebraremos o ponto mais alto do ano litúrgico de forma absolutamente estranha. E isso faz-nos sofrer (…) Sendo previsível que as coisas melhorarão ainda no decurso deste ano, temos muitas graças a dar a Deus porque, não obstante a dureza a que estamos submetidos, já antevemos o tempo novo, mais solidário e mais verdadeiramente familiar, que se seguirá à atual provação. O que nos motiva uma justificada esperança” (Dom Manuel Linda, Mensagem para a Quaresma 2021). À luz do mistério pascal, da Cruz, da morte e da ressurreição de Jesus, nós cremos e esperamos que as privações e provações, as tribulações e sofrimentos, as dores e mortes, que esta pandemia semeou, hão de frutificar em Páscoa de vida nova, para um mundo novo.
3. Por isso, irmãos e irmãs, apesar do cansaço da longa quarentena que nos testa e confina “a impossibilidade de fazermos as rotinas de sempre até nos pode ajudar a uma maior interiorização dos acontecimentos salvíficos que a motivam” (Ibidem)e levar a uma vida menos dispersa e mais recolhida, menos consumista e mais sóbria, menos egoísta e mais partilhada, menos exterior e mais familiar.
4. Assumir o programa quaresmal diocesano “Todos juntos na arca da Aliança” significa que, neste caminho, vamos todos juntos, pais e filhos, crianças e jovens, adultos e idosos, em família e em comunhão com a Igreja, como nos convocava o profeta Joel: “Congregai os anciãos, reuni os jovens e as crianças. Saia o esposo do seu aposento e a esposa do seu tálamo.Chorem os sacerdotes, ministros do Senhor”. Para isso, criemos em cada casa um cantinho de oração, para rezar e celebrar uma Liturgia Familiar, em que tenhamos oportunidade de redescobrir os tesouros de casa. Esta liturgia ajudar-nos-á a partilhar experiências de tudo quanto Deus fez por cada um, pela família, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, nos fracassos e sucessos, nas ofensas e perdão, nas crises e na sua superação, na rotina e nas surpresas de cada dia. Uma família que reza e faz memória agradecida, transmite a fé, não por ensinar o catecismo, mas por testemunhar e contagiar a graça de Deus, como pão de cada dia.
5.O Evangelho oferece três vacinas que nos imunizam do pecado e nos fraternizam a todos no coração do Pai. Contra o pecado da autossuficiência e do esquecimento de Deus, a vacina da oração filial, feita no segredo do nosso quarto, na intimidade da nossa casa; contra o pecado dos excessos de consumo, de ruídos e informações, de imagens e mensagens, a vacina do jejum; contra o pecado da indiferença, a vacina da esmola ou da partilha com os irmãos feridos, vítimas desta encruzilhada de pandemias. Em família, marquemos, na agenda, tempos determinados de oração; façamos juntos um plano de privação, de jejum e abstinência de quê, e vejamos, com rigor, o quê, como, quanto e em favor de quem… faremos a nossa partilha de bens. Em tudo e sempre – queridos irmãos e irmãs – o mais importante é caminharmos juntos, em direção à Páscoa, para que a nossa Aliança com Deus se renove, a partir de um coração novo, de uma vida nova, de famílias novas, que são realmente a esperança de um mundo renovado, por tanta dor e por muito mais amor.