Homilia no XXX Domingo Comum A 2020
1.Vem de muito longe o uso da máscara! E a máscara dos fariseus é mesmo muito requintada. Não lhes dobra nem esconde o nariz empinado, não lhes puxa as orelhas para dentro, nem lhes levanta o queixo para olhar de baixo para cima! Eles usam a verdadeira máscara, que não impede o contágio da sua malícia: a máscara da falsidade, da hipocrisia, do disfarce, do engano, da dissimulação. Como um ator no teatro grego, que usava uma máscara para representar um papel, eles escondem nas palavras elogiosas a Jesus a intenção de O pôr entre a espada a e a parede. Eis a pergunta: «Épermitido ou não pagar o imposto a César?» (Mt 22,17). É uma cilada para o Mestre. Se Jesus dissesse sim era acusado de colaborar com o poder romano e deixava de ser a esperança de quem via n’Ele um Messias libertador. Se dissesse não estaria à perna com o poder político romano, que o acusaria de dissidente e agitador.
2. Mas Jesus, que lhes conhece a malícia, faz-lhes cair a máscara da hipocrisia! Afinal são eles, e não Jesus, que trazem a moeda no bolso! Se eles próprios usam a moeda nas relações comerciais, se reconhecem o poder instituído, então não têm por que se queixar. Que cumpram as suas obrigações!Pagar o tributo a César não é um gesto de adoração ao Imperador, mas um ato devido à autoridade terrena. A referência à imagem de César, gravada na moeda, diz que é justo sentir-se a pleno título — com direitos e deveres — cidadãos do Estado, chamados a servir o bem comum.
3. Por outro lado — e é aqui que Jesus dá o “golpe de asa” — Jesus acrescenta um dado novo à pergunta. E diz que é preciso “dar a Deus o que é de Deus”. Deus é o único Senhor da vida e da história. A imagem na moeda faz pensar na outra imagem que está gravada em cada pessoa: a imagem de Deus (Gn 2,27). A inscrição na moeda faz pensar naquela passagem de Isaías, em que se diz que os convertidos à fé no Deus vivo trazem tatuada na mão a inscrição «do Senhor» e dirão: «Eu pertenço ao Senhor» (cf. Is 44,5). Na verdade, os nossos nomes estão inscritos no Céu (Lc 10,20). Portanto, é Deus o nosso único Senhor, e não o imperador, o rei, o presidente da república ou o primeiro-ministro, o ator ou o jogador de futebol, o trabalho, o prazer ou o dinheiro. É Deus o Senhor de tudo, e nós, que fomos criados “à sua imagem”, pertencemos-Lhe.
4. Então, dar a Deus o que é de Deus não significa apenas rezar e prestar culto, mas significa restituir, respeitar e promover a dignidade de cada pessoa humana, fundada na vocação divina a sermos filhos de Deus. Dar a Deus o que é de Deus não significa ignorar o mundo. Por amor a Deus e pela força do amor de Deus, cabe-nos transformar esta Terra à imagem do Céu, para fazer do mundo um pedaço do Reino de Deus. Se o ser humano é imagem de Deus, então cada pessoa é a outra face da boa moeda. Por isso, a glória de Deus é o homem vivente, feliz, realizado. E a vida do homem é plena na medida da sua entrega a Deus.
5. Da pergunta que Lhe fazem os fariseus, Jesus extrai uma pergunta radical e vital que podemos fazer a nós mesmos, neste Dia Mundial das Missões: A quem pertenço? À família, à freguesia, à cidade, aos amigos, à escola, ao trabalho, à política, ao Estado? Sim, sem dúvida. Mas antes de tudo, tu pertences a Deus. Esta é a tua pertença fundamental. Foi Ele que te deu tudo aquilo que és e tens. Então, a pergunta que te deves colocar é esta:“Para quem sou eu?”. Não o esqueças:“És para Deus, sem dúvida. Mas Ele quis que também fosses para os outros, e colocou em ti muitas qualidades, inclinações, dons e carismas que não são para ti, mas para os outros” (Christus vivit, n.º 286). Por isso, a tua forma de dar a Deus o que é de Deus é dares tudo pela vida dos teus irmãos. Eis então a pergunta decisiva de Deus, neste Dia Mundial das Missões: “A quem enviarei?”. A tua resposta justa só pode ser esta: “Senhor, eis-me aqui, envia-me” (Is 6,8). Sou todo teu, para os irmãos!