Homilia no III Domingo Comum A 2020 – Domingo da Palavra de Deus
1. Por vontade expressa do Papa Francisco, no 3.º Domingo do Tempo Comum de cada ano, somos convidados a celebrar e a viver “o Domingo da Palavra de Deus”! Não porque alguma vez pudéssemos celebrar o Domingo sem esta Palavra, mas para que a Palavra de Deus seja alimento bem servido à mesa de cada Eucaristia e se torne, para os cristãos, verdadeiro “pão de cada dia”. Precisamos da Palavra de Deus como de pão para a boca! Por isso, celebremos, em festa, o Domingo da Palavra, não para o fazer uma vez por ano, mas uma vez por todo o ano.
2. Fazemo-lo hoje com particular enlevo, para tomarmos consciência da importância da Palavra de Deus na nossa vida de cada dia, de modo que ela seja sempre “o farol dos nossos passos e a luz dos nossos caminhos” (Sl 118/119,105), aquela mesma luz que se levanta sobre a nossa escuridão (cf. Is 8,23-9,3)e que brilha e resplandece na Pessoa, na Palavra e na Vida de Jesus! É Ele, Jesus, a Palavra que Se fez Carne, a Palavra eterna de Deus que Se abreviou e Se aproximou e Se mostrou já presente no meio de nós. A Palavra de Deus, contida nas Escrituras, não é, por isso, um livro nem um rolo! Na sinagoga de Nazaré, depois de proclamar a profecia de Isaías, “Jesus enrolou o livro” (cf. Lc 4,20), para dizer que Ele é a Palavra viva, a Palavra ao vivo, a Palavra que lemos e vemos com os olhos fixos n’Ele (cf. Lc 4,20), antes mesmo de a ouvirmos da boca d’Ele. É n’Ele, é em Jesus que se cumprem as Escrituras. Isso é claro no Evangelho deste domingo, quando São Mateus nos diz, a respeito da primeira palavra de Jesus, nas periferias da Galileia: “assim se cumpria o que o profeta Isaías anunciara” (Mt 4,14). Deste modo, “oNovo Testamento está oculto no Antigo e o Antigo Testamento está patente no Novo” (Santo Agostinho).
3. Devem ficar claros para todos, estes dois princípios: todas as palavras das Escrituras falam de Cristo e anunciam-n’O! Sem estas palavras são indecifráveis a Palavra, a Vida, a Morte e a Ressurreição de Jesus. Por isso, disse São Jerónimo: “Desconhecer as Escrituras é ignorar Cristo”. Mas também é verdade o contrário: só a partir de Jesus se podem ler, compreender e pôr em prática as palavras das Escrituras. A Pessoa, a Palavra, os gestos e toda a vida de Jesus, consumada na sua morte e ressurreição, são, por isso, a nossa chave de interpretação das Escrituras. Quem ignora Cristo não entenderá jamais as Escrituras. Eis porque é tão importante para a fé sólida dos cristãos uma religiosa e assídua familiaridade com a Palavra de Deus, pois “a fé vem de ouvir a Palavra de Deus” (Rm 10,17).
4. Esta Palavra, inspirada por Deus e dita em linguagem humana, é “útil para ensinar, refutar, corrigir e educar na justiça” (2 Tm 3,16)e conduzir-nos à salvação. Precisamos de descobrir o tesouro desta Palavra, para permanecer e crescer no conhecimento íntimo e vital e na amizade pessoal com Cristo. A Bíblia não pode ser um livro decorativo, às vezes, carregado de pó. A Bíblia não pode ser património só de alguns e, menos ainda, uma coletânea de livros para poucos privilegiados. É o livro de todo o povo de Deus. Eis porque é tão importante a proclamação cuidada e a escuta atenta da Palavra de Deus, na celebração da Eucaristia, pois a Palavra de Deus mal proclamada é como que um aborto daquela vida nova, que podia germinar desta boa semente, no coração de quem a acolhe com amor.
5. Mas não basta. É preciso aprender a ler, a meditar, a rezar e a viver esta Palavra de Deus, em cada dia. Tomemos contacto diário com esta Palavra, começando pelo Evangelho do dia e pela oração dos Salmos. Deixemos as redes sociais que nos prendem e enredam, mas saibamos lançar mão destas mesmas redes e novas tecnologias, para escutar e anunciar a Palavra de Deus. Esta Palavra já não é só um livro de bolso! Ela está a um clique no telemóvel ou no computador. Nunca como hoje se pôde dizer, com tal propriedade, que “esta palavra está muito perto de ti, na tua boca e no teu coração, para a praticares” (Dt 30,14). Como Maria, tornemo-nos ouvintes e servidores desta Palavra, que é espírito e vida!
Sugestões para uma Homilia dialogada – Domingo da Palavra 2020
A Homilia pode ser feita em jeito de lectio divina, seguindo, de modo simples, pelo menos, os 4 passos: leitura, meditação, oração, ação. Para tal devem convidar-se os presentes a abrir a Bíblia, na passagem do Evangelho que acabaram de ouvir. É interessante manter uma conversação familiar com a assembleia, fazendo perguntas, de forma orientada, para ajudar os fiéis a descobrir as riquezas da Palavra.
1. O facto do Evangelho deste III Domingo Comum (Ano A) citar e modificar uma passagem de Isaías (Is 8,23-9,1) é uma boa pista para ajudar a compreender a relação de continuidade, rutura e separação entre o Antigo e o Novo Testamento: «O NT está oculto no AT e o Antigo está patente no Novo» (SantoAgostinho).
2. O Evangelho, por sua vez, reporta-nos ao início do ministério público de Jesus na Galileia e destaca o anúncio central de Jesus: o convite à conversão e a oferta do Reino.
3. A resposta dos primeiros discípulos ao chamamento de Jesus é um bom modelo de quem escuta a Palavra e lhe obedece, sem se deixar “enredar” pela teia dos interesses pessoais.
4. A ação de Jesus, que prega e cura, põe em evidência a necessidade de uma evangelização que se faz não apenas da Palavra anunciada, mas da Palavra vivida e testemunhada, posta em prática. A Palavra de Jesus é eficaz (realiza o que diz) e os gestos de Jesus são eloquentes (falam por Ele).
5. Na 2.ª leitura, São Paulo dá testemunho da centralidade do anúncio da Boa Nova, na sua missão. E fá-lo não com palavras da sabedoria humana, mas com a Palavra da Cruz, a Palavra definitiva do amor de Deus, que Se revela em Jesus. É à luz de Jesus que toda a Escritura deve ser lida. Ele é a Palavra, que Se fez Carne e nos dá vida.