Homilia na Comemoração de Fiéis Defuntos 2019
Comunhão de morte e de vida com Cristo
1. A água tem a força inaugural da vida e a força tremenda da morte! E, por isso, o início e o fim da nossa vida cristã estão sinalizados pela água batismal. Com a água derramada sobre a cabeça, recebemos o Batismo e, por meio dele, a graça de um novo nascimento, do nascimento para uma vida nova, para uma vida que jamais acabará! No Batismo começa um caminho que há de durar a vida inteira, um caminho com saída para a vida eterna! Na verdade, o cristão, desde o Batismo, é chamado a andar e a caminhar numa vida nova, que só se concluirá e chegará à sua plenitude quando a vida toda estiver consumida e a vida inteira for consumada com a morte e ressurreição em Cristo. Por isso, no rito de despedida, na celebração das exéquias, é retomada a água batismal, aspergida sobre o corpo do defunto. Assim se compreende que o ciclo da vida cristã, iniciado na água do Batismo, se cumpriu com a morte, e que a vida nova, então recebida, é agora, em união com Cristo, uma vida transformada pelo poder da Ressurreição do Senhor. Di-lo São Paulo, com toda a confiança: “Se morrermos com Cristo, também com Ele viveremos” (2 Tm 2,11).
2.O Ritual das Exéquias recorda-nos tudo isto de forma simples, ligando o sentido deste último gesto da aspersão do defunto ao primeiro gesto do banho batismal: “Pelo batismo, este(a) nosso(a) irmã(o) tornou-se verdadeiramente filho(a) de Deus, membro de Cristo ressuscitado e templo do Espírito Santo. A água que agora vamos derramar sobre o seu corpo recorda-nos essa admirável graça batismal, que o(a) preparou para ser concidadã(o) dos Santos no Céu. O Senhor aumente em nós a esperança de que este(a) nosso(a) irmã(o), chamado(a) a ser pedra viva do templo eterno de Deus, ressuscitará gloriosamente com Cristo” (Ritual das Exéquias, n.º 97).
3.Irmãos e irmãs: por estranho que pareça, esta é também uma bela oportunidade para mergulharmos, mais profundamente, no mistério pascal donosso próprio Batismo. São Paulo dizia-nos que “nós, que fomos batizados em Cristo, fomos batizados na sua morte. Fomos sepultados com Ele pelo Batismo na sua morte, para que, assim como Cristo ressuscitou dos mortos pela glória do Pai, também nós andemos numa vida nova” (Rm 6,4). De facto, o Batismo imerge-nos na morte e ressurreição do Senhor, afogando na pia batismal o homem velho, dominado pelo pecado que o separa de Deus, e fazendo com que nasçahomem novo, recriado em Jesus Cristo. N’Ele, todos são chamados para a vida nova. Ou seja, o Batismo é um verdadeiro renascimento!
4. Para os primeiros cristãos, este mistério do Batismo, que nos torna participantes da morte, sepultura e ressurreição de Jesus, era mais facilmente compreensível, porque mais visível. Na Igreja Antiga, o candidatoao Batismo eradespojado das suas vestes, descia umas escadas para mergulhar numa piscina e aí era imerso por três vezes. Depois de sair, permanecia num mosaico de seis quadrados, que evocavam as seis potências angélicas. Era uma forma visual de dizer que, doravante o batizado é cidadão do Céu e companheiro dos Anjos. Subindo das águas batismais, os neófitos eram depois revestidos com a veste branca, a veste luminosa de Deus, e recebiam a vela acesa como sinal da vida nova na luz que Deus mesmo acendera neles. Eles sabiam que tinham obtido o remédio da imortalidade. Por isso, dizia São Cirilo de Jerusalém aos novos batizados: “Num instante morrestes e num instante nascestes: esta água de salvação foi para vós um sepulcro e uma mãe”.
5. Graças ao Batismo, estamos já imersos na vida imortal, somos vivos para sempre. O Batismo é o primeiro passo da Ressurreição, é entrar e participar da vida indestrutível de Deus. Sendo o Batismo a nossa primeira páscoa, a nossa morte é a última páscoa, o renascimento definitivo para a vida eterna. Ao aspergir a água benta, recordemos isto: a este meu corpo mortal está prometida aressurreição! Morrer é a minha hora de renascer. Que Deus nos dê a graça de acabar de nascer, precisamente na hora de morrer com Cristo, para ressuscitar com Ele.