Homilia no V Domingo da Quaresma B 2018
1. “Fora da Cruz não há outra escada por onde se suba ao céu” (Santa Rosa de Lima; CIC, n.º 618)! E Jesus manifesta-o claramente quando identifica a Hora perturbadora e humilhante da Sua Cruz com a Hora grande da Sua glorificação; quando nos fala em ser elevado deste mundo, precisamente no momento em que o Seu Corpo, como o grão de trigo lançado à terra, desce ao túmulo. A quem O quer ver, Jesus manifesta-Se, escondendo-Se da multidão (cf. Jo 12,29.34). A quem procura as vanglórias deste mundo, Jesus garante a honra do Pai concedida aos que O servirem e seguirem pelo caminho da Cruz. Quem se ama a si mesmo perde-se; quem sai de si mesmo para servir o outro, alcança a vida verdadeira. Este é o mistério da Cruz, este é o paradoxo da vida cristã. Este é o caminho do amor, esta é a escada da Cruz, pela qual se sobe descendo e se desce subindo.
2. Este mistério escondido da Vida que é dada pelo preço da morte, da exaltação na Cruz, da elevação no abaixamento, da glorificação na humilhação, é-nos apresentado na bela imagem do grão de trigo que morre para frutificar (Jo 12,24). Esta imagem não se explica nem se justifica por nenhuma lógica que não seja a do amor: a do amor que anima a Sua vida e vivifica a Sua morte; a lógica do amor que não procura estar na vitrina, mas se faz invisível aos olhos alheios; daquele amor que não é arrogante nem orgulhoso (1 Cor 13,4), mas é humilde, porque não fala de si mesmo, não incha nem se engrandece diante dos outros; pelo contrário, o amor verdadeiro, como, por exemplo, o amor de um pai ou de uma mãe, não procura dominar, controlar, aparecer, mas trabalha sem procurar aplauso, serve às escondidas; o amor verdadeiro esforça-se por dar a vida e não pretende preservá-la ou possuí-la para si. A vida, como Deus a quer para nós, é sempre saída de si ao encontro do outro, no serviço aos demais. Este é o caminho do amor, esta é a escada da Cruz, pela qual se sobe descendo e se desce subindo.
3. Olhemos um pouco para a nossa vida e verifiquemos como nela se desenha a parábola do grão de trigo: as nossas alegrias nascem na dor; os maiores sucessos têm sempre o alto preço das nossas entregas escondidas; os nossos êxitos são feitos de sacrifício ocultos. Na verdade – e bem vistas as coisas – nenhum fruto, nenhuma coisa boa da nossa vida que ainda permaneça nos foram dados sem trazerem consigo o sinal da Cruz, sem terem esta marca do esquecimento, da negação, da humilhação, da morte de nós próprios: seja o filho que tivemos, a casa que construímos, o curso que fizemos, o casamento que vivemos. Mafalda Veiga cantava assim, numa das suas mais belas melodias: “É preciso morrer e nascer de novo; semear no pó e voltar a colher; há que ser trigo, depois ser restolho; há que penar para aprender a viver (…) A vida é feita em cada entrega alucinada, para receber daquilo que aumenta o coração”. Na verdade, o amor não incha de vaidade, não se importa de perder o que é seu, para ganhar o outro! Este é o caminho do amor, esta é a escada da Cruz, pela qual se sobe descendo e se desce subindo.
4. Estamos a passos largos da Semana Santa, dessa Hora infamante e gloriosa de Jesus. Em casal, em família, ou a sós, diante do Senhor, diante da Cruz, deixemo-nos examinar pelo amor, que não é arrogante nem orgulhoso, porque sempre se apaga e se esconde, para fazer brilhar a sua glória no rosto dos outros. Sem curar o orgulho e cultivar a humildade, não é possível, em família, compreender, perdoar e servir os outros! Por isso, conhecendo bem o segredo do grão de trigo, “revesti-vos todos de humildade no trato uns com os outros” (1 Pe 5,5).
Nunca esqueçamos a lei do amor e da vida: é preciso cada um dispor-se a morrer para si, para que frutifique cada vez mais, na sua própria família, a verdadeira alegria do amor, “que não é arrogante nem orgulhoso”(1 Cor 13,4)! Este é o caminho do amor, esta é a escada da Cruz, pela qual se sobe descendo e se desce subindo.