Homilia no XXIII Domingo Comum B 2018
1.“Um surdo que mal podia falar” (Mc7,32)! Talvez fosse mais correto apresentá-lo, apesar da redundância, como “um surdo que mal podia ouvir”. Mas não. O Evangelho insiste neste link entre a capacidade de escuta e a possibilidade da fala. A mesma ligação entre a escuta e a fala aparece na sequência da cura: “Imediatamente se abriram os ouvidos do homem, soltou-se a prisão da língua e começou a falar corretamente” (Mc 7,35). Deste modo, o Evangelho parece dizer-nos uma coisa muito simples: sabe falar apenas quem sabe escutar!
2.Se aplicarmos isto mesmo ao desafio pastoral que nos propomos viver neste novo ano: “Todos discípulos missionários”, podemos então dizer, com clareza: Só é missionário aquele que permanece discípulo! Isto quer dizer: só é missionário, só anuncia bem a Palavra, quem a escuta bem, quem se deixa penetrar e transformar por Ela, no encontro pessoal com Cristo!
3. Muitas vezes, para nos descartarmos da doce e reconfortante alegria de evangelizar, queixamo-nos de que não sabemos falar corretamente. É uma boa desculpa, que ilude a raiz do problema: se não sabemos falar é porque não somos capazes de ouvir. Por isso, mais importante hoje do que aprender uma arte de falar (a oratória) é desenvolver a arte de escutar(cf. EG 171).Porque só uma escuta assídua e profunda, no silêncio e no encontro pessoal com Jesus, gera um anúncio autêntico e eficaz. Só uma Igreja de discípulos ouvintes da Palavra se pode tornar uma Igreja de missionários, servos e testemunhas da alegria do Evangelho. “Se [o discípulo] não se detém com sincera abertura a escutar esta Palavra, se não deixa que a mesma toque a sua vida, que o interpele, exorte, mobilize, se não dedica tempo para rezar com esta Palavra, então na realidade será um falso profeta, um charlatão vazio” (EG 151). Discípulos surdos à sua mensagem serão como tartamudos a anunciar o Evangelho! Não necessitaremos então também nós de nos abrir a Jesus, para O deixarmos curar a nossa surdez? Podemos fazê-lo na oração pessoal diária com a meditação do Evangelho do dia, na oração comunitária, nos encontros da Catequese, e, desde logo, na Liturgia da Palavra, proclamada em cada Eucaristia.
4.Queridos irmãos e irmãs: não vos preocupeis com o que haveis de dizer! A primeira Palavra que temos a anunciar aos outros não está na ponta da língua. O anúncio da Boa Nova começa por ser aquilo que os outros dirão ao ver em nós os frutos dessa mesma Palavra. Se reparais, aquele homem curado fala corretamente! Mas quem bendiz o Senhor e anuncia as Suas maravilhas é a multidão, ao ver na vida daquele homem novo o milagre da abertura do seu coração, no encontro pessoal com Cristo.Portanto, o rosto belo da vida nova que a Palavra gera em nós é a primeira Boa Nova que temos a anunciar. A primeira mensagem oferece-se sempre sob a forma de imagem!
5. No Batismo, cumpriu-se aquele gesto e aquela palavra de Jesus: «Efatá! — Abre-te!» Todos fomos curados da surdez do egoísmo e do mutismo do fechamento e do pecado; todos podemos ouvir Deus, que nos fala, e comunicar a Sua Palavra a quantos nunca a ouviram ou a quem a esqueceu. Por isso, desde o Batismo, somos todos discípulos missionários. Escutemos, então, a palavra-chave, proclamada no dia do nosso Batismo e que desbloqueia também agora o nosso coração fechado: “O Senhor Jesus, que fez ouvir os surdos e falar os mudos, vos dê a graça de em breve poderdes ouvir a Sua Palavra e professar a fé, para louvor e glória de Deus Pai” (Ritual do Batismo, n.os 65-66; 101).