Homilia na Sexta-Feira Santa 2018
«Hão de olhar para Aquele que trespassaram» (Jo 19,37).
1.“Vede como vai prosperar o meu servo: subirá, elevar-se-á e será exaltado” (Is 52,13). No rosto de Jesus Crucificado contemplámos, em carne viva e na perfeição, a imagem, há muitos séculos desenhada neste cântico, pelo profeta Isaías. Mas, para nosso espanto, a escalada para o verdadeiro trono de glória do Servo de Deus não se faz “trepando” o pódio do poder e muito menos usurpando-o; Ele não Se eleva à custa do Seu título divino ou do apoio popular ou do reconhecimento da Sua carreira; mas é elevado, à medida que carrega sobre Si, até à queda e ao chão, as faltas de todos nós, com a paciência muda de um cordeiro levado ao matadouro (cf. Is 52,7). “Caiu sobre Ele o castigo que nos salva” (Is 52,5). O Servo de Deus cresce e faz prosperar a obra do Senhor, “oferecendo livremente a Sua vida, como sacrifício de expiação” (Is 52,10), quando outros julgavam poder tirá-la. E assim, compreendemos bem que na escada da Cruz se sobe descendo, até à humilhação do desprezo, para chegar à perfeição do amor.
2.“Vede como vai prosperar o meu servo: subirá, elevar-se-á e será exaltado”(Is 52,13). E nós olhámo-l’O, nós vimos fluir do Seu coração trespassado “a água e o sangue” (cf. Jo 19,34), as torrentes inesgotáveis da vida eterna, do amor que não acaba nunca (1 Cor 13,8). E, como “o grão de trigo lançado à terra” (Jo 12,24), vimos frutificar, no jardim da Sua entrega, a semente de uma pequenina comunidade de discípulos. São poucos ali os verdadeiros amigos de Jesus: o discípulo amado, a Mãe, algumas mulheres, José de Arimateia e Nicodemos. Mas são os primeiros frutos da árvore da Cruz, cuja descendência será duradoira (Is 52,13). E assim compreendemos bem que na escada da Cruz se desce subindo e se morre frutificando para a vida eterna!
3.“Vede como vai prosperar o meu servo: subirá, elevar-se-á e será exaltado”(Is 52,13). Ali, na Cruz, Jesus é realmente elevado, perante o nosso olhar, como outrora a serpente colocada sobre o poste no deserto (Jo 3,14; Nm 21,4). É, pois, olhando hoje para lá, para este Jesus trespassado, e não para a serpente, que somos alcançados e abraçados pelo amor que tudo suporta (1 Cor 13,7), pelo amor mais forte que o pecado e a morte. Ao subir à Cruz, Jesus sobe ao Seu trono real (Jo 19,19), de onde conquistará todos os corações (Jo 12,32-33; 18,28-19,16). Já no-lo tinha dito o próprio Jesus: “E Eu, quando for levantado da terra, atrairei todos a mim. E dizia isto para indicar de que morte iria morrer” (Jo 8,28; 12,32-33). Assim, compreendemos bem que “fora da Cruz, não há outra escada por onde se suba ao céu!” (Santa Rosa de Lima, CIC, n.º 618).
4.“Vede como vai prosperar o meu servo: subirá, elevar-se-á e será exaltado”(Is 52,13). Jesus, suspenso da Cruz, entre o Céu e a Terra, faz da Cruz a Sua escada de subida e descida, até junto de nós. Mediante a Cruz, Deus comunica à humanidade toda a riqueza do Seu amor infinito por nós. Não rejeitemos, pois, subir descendo ou descer subindo, por esta escada da Cruz, no mais pequenino sacrifício ou no mais doloroso sofrimento de cada hora. É assim o caminho do amor, daquele amor que tudo vence, tudo supera e tudo suporta (1 Cor 13,7).
5.“Vede como vai prosperar o meu servo: subirá, elevar-se-á e será exaltado”(Is 52,13). A subida é realmente cansativa; e tantas vezes tropeçamos, porque os primeiros degraus “têm raiz em terra árida” (Is 52,2), estão ancorados na escuridão; mas lá em cima, no alto da Cruz, há uma luz infinita, onde brilha o esplendor do verdadeiro amor. Com o archote da esperança e com o desejo da procura, façamos uma “escada no deserto para fixar a luz” (Daniel Faria). Subamos descendo, desçamos subindo, degrau a degrau, de luz em luz, pela escada da Cruz.
Irmão, irmã: olha bem para o Crucificado. Deixa-te olhar bem por Ele. Não estás à altura? “Põe uma escada e sobe ao cimo do que vês”(Daniel Faria).