Homilia no I domingo da Quaresma B 2018
O amor é paciente (1 Cor 13,4)
1.O dia dos namorados reduziu praticamente a cinzas a quarta-feira, que marcou o início da Quaresma! E na coincidência feliz destas duas datas,a Quaresma deste ano desafia-nos a não deixar esfriar o amor e a deixarmo-nos mover pelo amor de Deus, que Se entrega na Cruz! Felizmente há a Quaresma, que “anuncia e nos torna possível voltarmos ao Senhor, de todo o coração e com a nossa vida” (Papa Francisco, Mensagem para a Quaresma 2018), ou, como nos recorda o profeta Oseias, este é o tempo, em que Deus, apaixonado pelo Seu Povo, como o esposo pela esposa, nos leva ao deserto, para nos falar ao coração e nos fazer voltar ao primeiro amor (cf. Os 2,16; Ap 2,4). A Quaresma pode ser vivida como uma espécie de namoro intensivo e extensivo, para não deixar esfriar o amor de Deus, “que corre o risco de apagar-se, nos nossos corações” (MQ 2018). De algum modo, a nossa conversão quaresmal passa pelos exercícios de aquecimento, de descida e de subida, degrau a degrau, na escada da Cruz.
2.E o primeiro degrau da escada do amor é a paciência (cf. 1 Cor 13,4). Esta paciência não é resignação nem conformismo, mas a virtude da resistência, para suportar as dificuldades do caminho e a lentidão e demora da mudança. A paciência é realmente uma qualidade do Deus da aliança, que sabe esperar por nós todo o tempo do mundo e que nos dá, mais uma vez, o tempo santo da Quaresma, para nos decidirmos a entrar na arca do Seu amor, para nos deixamos envolver no arco da Sua aliança! A história da salvação, desde o dilúvio, nos tempos de Noé, mostra-nos a infinita paciência de Deus, que conduziu e levou adiante o Seu povo, um povo de cabeça-dura, que nem sempre correspondia às suas expectativas. Paciência é também aquela que Deus Pai tem com cada um de nós, acompanhando-nos e esperando os nossos tempos, os nossos lentos passos, em direção a Ele.
3. Faz-nos muita falta esta paciência na vida familiar. É o atributo que São Paulo coloca à cabeça, quando descreve o amor cristão: o amor é paciente. Ter paciência não é deixar que nos maltratem permanentemente, nem tolerar agressões físicas, ou permitir que nos tratem como objetos. O problema surge quando exigimos que as pessoas sejam perfeitas, ou quando nos colocamos no centro, esperando que tudo se faça segundo o nosso ritmo, o nosso jeito e a nossa vontade. A paciência implica sabedoria para dialogar com os limites, na minha vida e na vida dos outros; mas a impaciência não os quer admitir, ignora-os porque não sabe dialogar com eles. Ora, se não cultivarmos a virtude da paciência, encontraremos sempre desculpas para responder com ira, acabando por nos tornarmos pessoas que não sabem conviver, incapazes de dominar os impulsos. E então a família tornar-se-á um campo de batalha. Esta paciência reforça-se quando reconheço que o outro, tal como é, mais lento ou mais apressado, mais calmo ou mais stressado, também tem direito a viver comigo nesta terra. O amor possui sempre um sentido de profunda compaixão, que leva a aceitar o outro como parte deste mundo, mesmo quando age de modo diferente daquilo que eu desejaria (cf. Papa Francisco, AL, 91-92).
4. Paremos um pouco, pensemos na paciência de Deus para connosco e imitemos a paciência de Jesus. Peçamos ao Senhor que nos dê paciência para suportar com alegria as provações da vida e aceitar com humor os limites, sem ceder à ira. À mesa, desliguemos o televisor, o telemóvel, o computador, e dialoguemos, em família, a partir destas perguntas: Sou capaz de aceitar o ritmo, o feitio e o modo de ser dos outros? Ou perco a paciência com a lentidão e o jeito de ser dos que me rodeiam?
5.E pelas vezes em que nos colocámos no centro do mundo e impusemos a nossa vontade… pelas vezes em que reagimos com agressividade, ira e azedume… pelas vezes em que não aceitámos os outros na sua maneira singular de ser e agir, peçamos perdão ao Senhor, que é lento para a ira (Nm 14,18; Ex 34,6)e rico em misericórdia.