HOMILIA NO V DOMINGO DA QUARESMA C 2025
1. Esta cena do Evangelho é tão escandalosa como deliciosa. Houve mesmo quem não gostasse de ver esta cena escaldante incluída na redação dos Evangelhos. Parece que o texto original andou aos papéis, até cair na mão do autor do Quarto Evangelho. O texto merecia uma leitura mais pausada, para captarmos a revolucionária atitude de Jesus, frente ao rigor legalista, impiedoso e implacável dos falsos piedosos do seu tempo. Mas, no contexto do Jubileu, permitam-me que o foco da reflexão se concentre no perdão divino, como motor da esperança.
2.Para Jesus, cada eu, tu, cada um de nós é visto, querido, esperado e amado, antes do pecado, antes da lei e dos seus juízos. Jesus sabe que a pessoa é sempre maior que o seu pecado, é sempre maior que o mal praticado. Por isso, Jesus crê e espera sempre mais em nós e de nós. O que lhe interessa não é o nosso pecado, o a culpa, o remorso, que são coisas do passado. Jesus olha o futuro. Ele quer que voltemos a pormo-nos de pé, que não nos deixemos amarrar e paralisar pelo mal, como uma pedra pesada que nos impede de avançar e viver. Jesus vê sempre em nós o melhor de nós, vê a possibilidade de mudança, de recriação, de regeneração, de ressurreição. E por isso diz àquela mulher: Vai e não voltes a pecar. Como quem diz: há esperança também para ti! Esta é a graça do perdão: esquecer o passado e dar de presente uma nova oportunidade ao futuro. Não há santo sem passado nem pecador sem esperança de futuro!
3.Com o Seu perdão, Jesus oferece-nos mais do que um tranquilizante, para atenuar o sentimento de culpa. Com o Seu perdão, Jesus oferece-nos a esperança de uma vida nova, proporciona-nos um novo começo, cria-nos de novo, recria-nos, desafiando-nos: «Olha para a frente e Eu dar-te-ei um coração novo». Liberta-te do teu passado. Tu és maior que o teu pecado. Caminha em frente. Com o seu perdão, Jesus ancoraja-nos sempre a recomeçar.Esta é a esperança que Jesus nos oferece” (cf. Papa Francisco, Audiência, 09.08.2017). O seu perdão divino é o motor da esperança. E a esperança não olha para trás, corre por caminhos de futuro.
4.Diz-nos o Papa Francisco: “Perdoar não muda o passado, não pode modificar o que já aconteceu; no entanto, o perdão pode-nos permitir mudar o futuro e viver de forma diferente, sem rancor, ódio e vingança” (SNC, n.º 23). E, por isso, o perdão é sempre um motor de esperança. Deus perdoa, por amor, a um ser humano, que não «merece» esse amor, mas oferece-o quando mais precisa dele, precisamente, para lhe dar uma nova oportunidade, para que possa virar a página da sua vida! Deus não nos perdoa porque nos arrependemos. Nós é que nos arrependemos, na medida em que fazemos a experiência de quanto Deus nos perdoa.
5.Por isso, este perdão recebido da parte de Deus deverá converter-se em perdão oferecido aos irmãos. E perdoamos a quem nos ofendeu, não porque se converteu, mas porque eu me converti, porque eu tomei a decisão de perdoar, de não guardar dentro de mim o mal recebido, como um vírus que me contamina cada vez mais. Perdoo, não em primeiro lugar, porque o outro o mereça ou dê sinais de arrependimento, mas porque eu próprio não quero alimentar dentro de mim o veneno da ofensa, que me destrói. Por isso, o perdão não dá só esperança de futuro e oportunidade de virar a página da vida a quem me ofendeu. O perdão liberta-me também a mim do mal e do passado e deixa-me livre para o futuro!
Irmãos e irmãs: a celebração do Jubileu acontece para que a todos seja dada a esperança do perdão (cf. Papa Francisco, Homilia, 24.12.2024). Nesta 5.ª semana, o grande apelo é este: «Ancoraja-te e perdoa». Reza para te abrires à graça do perdão recebido e fazeres dele perdão oferecido. «Ancoraja-te e perdoa». Vai em frente, peregrino de esperança, dizendo a cada passo e a cada tropeço da peregrinação: «No caminho eu confio em Ti».