Liturgia e Homilias na Comemoração de Todos os Fiéis Defuntos 2022
Destaque

Cristo vive! Cristo, nossa esperança, está vivo e é a mais formosa juventude deste mundo. Ele vive e quer-nos vivos (cf. Christus vivit, n.º 1). Este é um dia, para contemplarmos o mistério da nossa morte, na luz deste Cristo vivo e Ressuscitado. Graças à sua vitória pascal, o mal e a morte não terão a última palavra. Porque Ele, o Eterno Vivente, saiu vitorioso do túmulo, nós não mais atravessaremos sozinhos o vale tenebroso da morte, porque podemos contar com a Sua mão poderosa e encontrar n’Ele uma passagem para a vida plena. É deste Cristo vivo que recebemos o bálsamo para as feridas aberta no coração, pela morte dos nossos familiares e amigos. Que esta Eucaristia nos reconforte na dor e “aumente em nós a esperança de que os nossos irmãos e irmãs ressuscitarão gloriosamente com Cristo” (cf. Ritual das Exéquias, n.º 97).

Homilia na Comemoração de todos os fiéis defuntos 2022

1. “As mulheres foram ao sepulcro, levando os perfumes que tinham preparado” (Lc 23,1). Dão um toque bem feminino e continuam os gestos corajosos de José, membro do Sinédrio, que envolveu o corpo morto de Jesus num lençol e O depositou num sepulcro novo. Visitar o túmulo do grande amigo, ungir o corpo morto de Jesus, perfumá-lo, é um gesto de grande ternura, uma obra de misericórdia, um selo de amor sobre a própria morte. Estas mulheres demonstram a coragem de enfrentar, com realismo, sem fugas nem estados de negação, a perda do amigo. Elas não têm medo de tocar o cadáver frio, do qual já não se pode receber a resposta do calor humano, mas cuja vida consumada por amor continua a falar-lhes ao coração. Elas não pretendem ungir Jesus, para encobrir a sua morte, para fazer parecer que está vivo, como o fazem agora as funerárias, nos cuidados cosméticos do cadáver, dando-lhe uma certa aparência de vida, como se fosse possível e desejável ter um morto que não tivesse morrido. Não. Elas não se deixem levar pelo mito da eterna juventude, que é capaz até de sonhar com a abolição da morte. Elas não fogem à realidade da morte nem evitam o contacto pessoal com o seu amigo morto. Elas sabem que esse toque, esse olhar, as humaniza. Como poderíamos conhecer a fundo a nossa humanidade, na sua miséria mortal e na sua grandeza eterna, sem tocar a realidade da morte, num corpo morto?!

2. Creio que o gesto destas mulheres, na sua cumplicidade tão íntima com o mistério da vida, destina-se, sobretudo, a selar e a confirmar a morte, mas acena também a confiança secreta e discreta de que, apesar de tudo, o amor ainda poderá remover a pedra do sepulcro, porque o amor é sempre mais forte do que a morte (Ct 8,6)! De algum, modo, há nesta visita ao túmulo uma friesta aberta de esperança, no caminho de transformação da semente do corpo lançado à terra. O ser humano é húmus, vem da terra e para ela volta. Contudo volta à terra, como uma semente caída da planta, regressa ao lugar de onde veio, como uma promessa de vida.  

3. Esta é, pois, uma grande lição para este nosso tempo, em que a morte já não tem lugar em nossa casa, em que a morte se tornou tabu de qualquer conversa, realidade clandestina a evitar, a apressar e a despachar o mais depressa possível, fora do nosso olhar, do nosso toque, do nosso cheiro. O sucesso da cremação, talvez se perceba no contexto desta fuga à realidade nua e crua da morte, da qual desejamos não restarem quaisquer vestígios. Também nisto, damos a impressão de que o corpo só nos interessa enquanto nos for útil. Porque será que queremos anular definitivamente – numa desaparição tão rápida – os que deviam perdurar na nossa memória e hão de ressuscitar para a vida eterna? Não podemos esperar a ressurreição dos mortos, se não enfrentarmos com humildade a realidade da morte!

4. Foi talvez por esta coragem de enfrentar a morte, que estas mulheres puderam escutar na manhã de Páscoa a notícia da Ressurreição do Senhor: «Porque buscais entre os mortos Aquele que está vivo? Não está aqui: ressuscitou» (Lc 24,5). “Ele vive! (…) Aquele que nos enche com a sua graça, Aquele que nos liberta, Aquele que nos transforma, Aquele que nos cura e consola é Alguém que vive. É Cristo ressuscitado, cheio de vitalidade sobrenatural, revestido de luz infinita” (Ch. Vivit, n.º 124). Por isso, esta notícia luminosa atinge-nos a todos, como bem o exprimem as velas acesas. Ele morreu por nós, incarnando a palavra do amor até dentro da própria morte. Ele ressuscitou para nós, para nos fazer ressuscitar com(o) Ele. Ele foi o primeiro que começou a viver a Vida bela e plena, que vai para além da morte. Por isso, “se morremos com Cristo, acreditamos que também com Ele viveremos” (Rm 6,8).

5. Irmãos e irmãs: não há nada mais consolador do que saber que o nosso corpo ressuscitará transformado, que a morte e a consequente separação das pessoas queridas não é a última palavra! Não procuremos cosméticas de aparência, para mascarar a realidade da morte. Seja Cristo Vivo e Ressuscitado, “a mais formosa juventude do mundo” (Christus vivit, n.º 1), o verdadeiro bálsamo para as feridas do nosso luto pela morte e da nossa luta pela vida, pelos séculos sem fim! Ámen.

 

 

 

 

Top

A Paróquia Senhora da Hora utiliza cookies para lhe garantir a melhor experiência enquanto utilizador. Ao continuar a navegar no site, concorda com a utilização destes cookies. Para saber mais sobre os cookies que usamos e como apagá-los, veja a nossa Política de Privacidade Política de Cookies.

  Eu aceito o uso de cookies deste website.
EU Cookie Directive plugin by www.channeldigital.co.uk