HOMILIA NO XXXI DOMINGO COMUM C 2022
“Deus omnipotente (…) fazei-nos caminhar, sem obstáculos, para os bens por Vós prometidos”. Assim rezávamos há pouco na oração coleta, que concluiu os ritos iniciais de acolhimento. Há sempre obstáculos no caminho, que nos podem impedir de alcançar a meta dos bens prometidos, como, por exemplo, a fé, a vocação e – no horizonte mais largo de tudo isto – a salvação e a vida eterna. E o Evangelho apresenta-nos hoje a figura de Zaqueu, que tem de superar uma verdadeira prova de obstáculos. Poderíamos apontar, pelo menos, três: a baixa estatura, a vergonha e aquela multidão que murmura.
1. O primeiro obstáculo é a baixa estatura: Zaqueu não conseguia ver o Mestre, porque era pequeno. Também hoje podemos correr o risco de ficar à distância de Jesus, porque não nos sentimos à altura, porque temos uma fraca opinião a nosso respeito. Esta é uma tentação, que não tem muito a ver com a nossa baixa autoestima, mas diz sobretudo respeito à pouca fé. Porque a fé diz-nos que “Deus ama tudo o que existe e não odeia nada do que criou” (Sb 11,22-12,2), muito menos odiaria o ser humano, obra-prima da sua criação. Esta é a nossa estatura, esta é a nossa identidade espiritual: somos filhos cridos e queridos por Deus, esperados e amados por Ele. Tu és importante! Não és insignificante. E Deus conta contigo por aquilo que és e por aquilo que podes vir a ser (cf. Ch. Vivit, 289). A Seus olhos, no seu amor infinito, o teu valor é inestimável. Dirás: Sou pó! Sim. Mas és um pó amado, insuflado pela vida divina, um pó transformado por Deus. A quem se reconhece assim, Jesus pode chamar pelo nome, para uma amizade especial, para uma vocação radical, conjugal, religiosa ou sacerdotal. E por que não havia de te chamar a ti, ou a um filho teu, ou a um irmão teu, ou a um primo teu ou a um amigo teu? Olha que estás à altura! E não estará já na altura de dizeres “Sim”? Há pressa no ar!
2. Zaqueu tinha um segundo obstáculo: a vergonha paralisadora. Ele era uma figura pública. Sabia que, ao subir à árvore, se tornaria ridículo aos olhos de todos. Mas superou aquela vergonha, e correu, porque a atração de Jesus era nele mais forte. “Quem tem vergonha, passa mal”, diz o provérbio popular, e diríamos nós, “quem tem vergonha, não chega a alcançar os bens prometidos, a vida na sua plenitude”. Por isso, no início desta Semana de Oração pelos Seminários, é muito atual o apelo de Paulo, na prisão, ao jovem Timóteo: «Não te envergonhes de dar testemunho de Cristo» (cf. 2 Tm 1,8). Tenhamos vergonha, sim, dos nossos pecados, dos pecados da nossa Igreja, porque essa vergonha é um passo para a conversão. Mas não tenhamos vergonha de amar a Cristo e a Igreja, Sua Esposa amada. Sobretudo aos mais novos, faço este apelo: Não tenhais vergonha, dai a cara por Jesus, dai um testemunho alegre da vossa fé, com as vossas capacidades, energia, audácia e criatividade. A cada um de vós, Jesus chama à amizade com Ele e pode chamar-te também a ti, a uma entrega mais radical.E agora sou ainda mais direto: Queres mais padres, padres mais santos? Olha que bom! Mas tens vergonha de pensar esta vocação para ti? Tens vergonha de a propor a um filho, a um irmão, a um primo, a um amigo? Dessa vergonha é que te deves envergonhar.
3. Um terceiro obstáculo é a multidão murmuradora, que bloqueou Zaqueu e criticou Jesus. Hoje a multidão murmuradora está nas páginas dos jornais, nas redes sociais, na má-língua das conversas pessoais, sempre que se fala da Igreja, e muito particularmente dos padres. Certamente, há crimes intoleráveis, que não devíamos nunca suportar e calar. Mas os padres também são filhos de Abraão! Não precisam apenas de censura e acusação, mas de cura e de ternura, de proximidade e de atenção, de perdão e de compaixão, de apoio e de confiança no seu ministério. De entre os Doze, a quem Jesus chamou, não estavam 12 homens de ficha limpa! Nem um sequer. Estavam aqueles para quem Ele olhou com misericórdia! Queres padres felizes? Não entres no coro desafinado dos gritos da multidão. Não fales mal do padre da tua paróquia. Fala com ele e por bem. Faz-te amigo dele e, quem sabe, faz-te como ele. Esta é a melhor forma de descobrires, assumires e promoveres, com o teu testemunho, a beleza da vocação sacerdotal.