Homilia no XIX Domingo Comum B 2021
“Levanta-te e come! Tens ainda um longo caminho a percorrer” (1 Rs 19,5.7)!
1.Caminhar está na moda. Seja às voltas do quarteirão do prédio ou do bairro, seja pelos caminhos da aldeia ou pelas ruas da cidade, seja pelos passadiços da montanha ou pelas calçadas à beira-mar. Seja ainda, noutros ritmos, a palmilhar pelas várias rotas do caminho de Santiago ou de outros lugares de peregrinação. Uns caminham para manter a forma física, outros para restabelecer a sanidade mental, outros para rezar com os pés, como peregrinos do Absoluto, em busca da beleza, da verdade. Uns caminharão por devoção, outros por obrigação, em busca de um teto, de uma terra, de um trabalho. E são tantos e tantas.
2. A questão mais importante, para quem faz o caminho, é a de ter um rumo, é a de conhecer a direção justa, para não correr em vão, sem direção nem sentido. Há, de facto, quem caminhe em volta de si mesmo, no circuito fechado dos seus interesses. Há quem caminhe para fugir de si, do seu passado, do seu presente ou mesmo do seu futuro. É o caso de Elias, o profeta refugiado na gruta, que foge à perseguição e procura apenas um lugar para morrer. Mas há, graças a Deus, quem caminhe na caridade, a exemplo de Cristo, que nos amou e Se entregou por nós. São todos aqueles que se levantam do sofá da sua comodidade e saem pelas estradas do mundo, em direção às periferias existenciais, dos sós, dos frágeis, dos excluídos. Estes cuidam de quem está ferido e procuram quem anda extraviado, sem preconceitos nem medo, sem aproveitamento político ou religioso, prontos a ampliar a sua tenda para acolher a todos.
3. Neste início da 49.ª Semana Nacional das Migrações, o Papa Francisco deixa-nos o desafio a caminhar. Mas define um modo e um rumo. Caminhemos juntos rumo a um nós cada vez maior. Juntos,porque os caminhos de distração individualista são fatais. Juntos, porque os caminhos de fuga ou isolamento não têm saída. Juntos, porque sozinhos podemos ter miragens, vendo o que não existe (FT 8). Vede que até o lema olímpico foi ampliado com este advérbio de modo: “mais rápido, mais alto, mais forte – juntos”. Os católicos, que, por definição, devem ter um coração fraterno e universal, e todos os homens e mulheres de boa vontade, são desafiados a trabalhar juntos para recompor a família humana, para construir em conjunto o nosso futuro de justiça e paz, tendo o cuidado por que ninguém fique excluído. Para isso, empenhemo-nos em derrubar os muros que nos separam e em construir pontes de escuta e de diálogo, que favoreçam uma cultura do encontro, conscientes da profunda interligação que existe entre todos nós.
4. Isto podemo-lo fazer, desde já, com os nossos emigrantes, que regressam a Portugal. Saibamos acolhê-los entre nós, para que se sintam em sua própria casa. Isto podemo-lo fazer com os que procuram o nosso país para viver em paz, para estudar, para trabalhar e melhorar a sua vida. Estes imigrantes são uma bênção, a começar pelos dons que nos oferecem da sua diversidade cultural e religiosa e do seu admirável testemunho de resiliência. São eles que nos prestam os serviços mais humildes. Deles precisaremos cada vez mais, até pela crise demográfica que vivemos. Acolhendo-os, protegendo-os, promovendo-os, integrando-os, florescerá o milagre de um nós cada vez maior.
5. É possível realizar este sonho de caminharmos juntos, para este nós cada vez maior? Sim. Se o Pai nos atrair para o Filho, no laço do Espírito Santo. Aí sim, no Pai Comum, descobrir-nos-emos a todos filhos e filhas muito amados. No Filho Único, reconhecer-nos-emos irmãos e irmãs muito queridos! No Espírito Santo, encontrar-nos-emos como única família, companheiros da mesma viagem, nesta Terra, que é a nossa Casa comum, com o teto bem aberto para o Céu!