Liturgia e Homilias no XXVI Domingo Comum A 2020
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Continuamos, neste domingo, a escutar o convite do Pai a trabalhar como filhos na vinha da Igreja, do nosso mundo, da nossa Casa comum. Há quem diga logo que “sim”, mas depois vire as costas; e há quem diga que “não”, mas depois se arrependa e vá. A parábola deste domingo é uma espécie de placa giratória: na medida em que ela se dirige aos que se acham justos, adverte-os para o risco de se tornarem pecadores hipócritas e instalados; na medida em que ela se dirige aos pecadores, dá-lhes a possibilidade de se porem a caminho, à escuta do Senhor, arrepender-se e levantar-se.Quero ser um humilde pecador a caminho… ou um pecador hipócrita, instalado na sua vida dupla? Eis a questão que está em cima da mesa da Palavra, nesta Eucaristia. 

Homilia no XXVI Domingo Comum A 2020

1.“Todos família, todos irmãos” é o lema do nosso ano pastoral 2020/21, que só poderemos viver bem na medida em que redescobrirmos mais profundamente a imagem de Deus como Pai. E a parábola deste domingo – que até parece inspirada numa cena infantil lá em casa – põe-nos de frente a um Pai que não nos trata nem contrata como trabalhadores, mas que nos ama como filhos e nos chama a partilhar com Ele o cuidado desta vinha, da Igreja, do mundo, nossa Casa comum.

2. A parábola diz-nos que este pai tem dois filhos. Iguais na contradição entre o dizer e o fazer a vontade do pai, mas diferentes na sua desobediência. No primeiro, apesar do “sim” imediato, dito da boca para fora, a voz do pai estava sepultada no seu coração e, por isso, este filho segue a sua vidinha, de aparência e fachada, sem se preocupar mais com a vontade do Pai. Este primeiro filho tornou-se impermeável à voz de Deus e da consciência, para abraçar uma vida dupla, em que diz uma coisa e faz outra. É bem diferente, porém, a desobediência do segundo filho: apesar daquele “não”, impensado e repentino, ressoava ainda a memória do convite do pai.  Por isso, a recordação do amor do pai arrancou-o e desinstalou-o da preguiça, fazendo-o maturar e mudar de ideias e de caminho. Daí a nossa simpatia natural pelo filho rebelde, o único que, de facto, se arrepende; é verdadeiramente um pecador a caminho, que aproveita a liberdade e a espera paciente do Pai como oportunidade de arrependimento e de regresso a casa.

3. Mas eu gostaria, sobretudo, de me colocar na pele e no papel do pai, referido na parábola, como imagem deste Deus que é Pai e afinal ninguém é tão pai como Ele (cf. CIC 239). Jesus fala-nos de um pai que não é bem-sucedido na educação dos seus filhos. Vede: até este Deus Pai, “de quem procede toda a paternidade” (Ef 3,15), Se sente falhado na sua missão educativa. Podemos imaginar o seu coração ferido, quando ouve aquele “não” do filho, a pensar de Si para Si: “Onde falhei eu? Será que não tive o tato, a melhor pedagogia, a boa psicologia, para educar o meu filho”? Ora, sejamos claros. Nem todos os infortúnios dos filhos são consequência direta dos erros dos pais. Quem aqui disse “não quero” foi o filho. Os filhos não são uma réplica nem um produto dos pais. São também eles próprios, com a sua singularidade e as suas escolhas livres e pessoais. Precisamos de ajudar os filhos a superar o complexo da autoridade dos pais e de ajudar os pais a libertarem-se do complexo de culpa em relação aos filhos. Dantes eram as culpas dos pais que recaíam sobre os filhos; hoje passa-se o contrário: são as culpas dos filhos que recaem sobre os pais! E nem uma coisa nem outra, em absoluto, são sensatas. Pelo contrário: o amor verdadeiro de um pai abre à liberdade do filho a possibilidade da sua rebelião. O verdadeiro pai é o que oferece ao filho a possibilidade de este lhe vir a dizer “não”. É verdade que o amor do Pai não gera nem espera o “não” (que é resposta livre do filho), mas torna-o realmente possível. 

4. Por outro lado, queridos pais e demais educadores, queria dizer-vos isto: o caminho da rebelião dos filhos (ou dos alunos) não é necessariamente um caminho sem saída. Pode conduzi-los a um futuro de paz, pelo que a virtude principal dos pais e educadores, contestados ou rejeitados pelos filhos, é a esperança de um caminho sempre aberto. Depois dos fechamentos e dos longos silêncios, de um lado ou do outro, é bom recuperar o encontro, mesmo se ainda habitado por conflitos, que podem tornar-se estímulo de um novo equilíbrio. Não desanimemos.

5.Tal como em família, também na Igreja, na escola e na sociedade, a parábola enche-nos de esperança numa mudança positiva: nunca devemos renunciar ao encontro, ao diálogo, a procurar novas vias, para caminharmos juntos: pais e filhos, avós e netos, crentes e não crentes, uns e outros. Caminhemos todos juntos, nas diferenças que nos distinguem, mas que não apagam nunca a consciência da nossa abençoada pertença comum ao Pai, que faz de nós “todos família, todos irmãos”.

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