Homilia no 5.º Domingo da Quaresma A 2020 | Transmissão pelo Facebook
Senhor, se aqui estivesses meu irmão não teria morrido (Jo 11,21.32)!
Creio que este desabafo – quase uma censura a Jesus, da parte de Marta e de Maria – dá voz às nossas revoltas e protestos, mais ou menos silenciosos, destes últimos dias. Também nós diremos a Jesus, diante do agudo sofrimento provocado por esta pandemia da COVID-19: “Senhor, se Tu estivesses connosco, não morreria esta ou aquela pessoa, não morreriam tantas pessoas”.
Marta e Maria dizem-no, hoje, em nossa vez, em nome da profunda amizade de Jesus. Nisto elas tinham toda a razão. Marta e Maria sabiam que não é a mesma coisa ter conhecido Jesus ou não O conhecer, não é a mesma coisa poder escutá-Lo ou ignorar a sua Palavra. Elas sabiam que a vida com Jesus se torna muito mais plena e, com Ele, é mais fácil encontrar o sentido para cada coisa (cf. EG 266). Por isso, voltam-se para Jesus, como seu refúgio e sua esperança. Estas santas mulheres sabem, por intuição feminina, que dizer a alguém «eu amo-te», é dizer-lhe “tu não morrerás” e por isso sustentam toda a sua esperança a partir desse amor de Jesus por Lázaro. Não por acaso, é nestes precisos termos que chega a Jesus a notícia da situação crítica do amigo Lázaro: “Senhor, aquele Tu amas, está doente” (Jo 11,3). Jesus tinha ali, portanto, um amigo em risco de vida, um amigo que viria então a morrer. Trata-se de amigo, vindo de uma família amiga, de uma família que hospedava Jesus. Todavia – vede bem – esta amizade de Jesus por Lázaro, Marta e Maria, não é “um seguro de vida”, nem “um seguro contra todos os riscos”. Os amigos de Jesus não estão imunes ao sofrimento e à morte! Aliás, nem o próprio Jesus será poupado à morte. Depois deste sinal da ressurreição de Lázaro, o evangelista diz que o Conselho dos Sumo-Sacerdotes decidiu dar a morte a Jesus (cf. Jo 11,45-57), morte a que também Jesus não será poupado.
Senhor, se aqui estivesses meu irmão não teria morrido (Jo 11,21.32)!
Marta e Maria esperavam que Jesus, por ser tão amigo de Lázaro, pudesse chegar a tempo de evitar a morte e têm confiança de que ainda é possível reverter a situação, pela sua intercessão, junto do Pai. Mas, na verdade, Jesus promete a Marta muito mais do que aquilo que ela Lhe está a sugerir e a pedir. Jesus não vem a este mundo para prolongar a nossa vida ou para adiar a nossa morte. Jesus vem para dar a Sua Vida, para nos tornar participantes da vida nova da Ressurreição, para nos dar uma vida que não acaba na morte, mas que seja, desde já, uma vida em abundância (cf. Jo 10,10). A promessa e a esperança que Jesus dá aos seus amigos não é, portanto, a de os poupar à morte. É a certeza de a todos fazer ressuscitar, para uma vida, que não mais acabará.
Senhor, se aqui estivesses meu irmão não teria morrido (Jo 11,21.32)!
Jesus promete a Ressurreição, a quem n’Ele crê. Isto não é uma teoria, uma ilusão, uma anestesia para doce consolação! Jesus demonstra-o, em carne e osso: suspira profundamente, comove-se, chora, aproxima-se de Lázaro morto, reza ao Pai para que O atenda nessa Hora e dá um grito, uma ordem de saída: “Lázaro, vem para fora” (Jo 11,43). Este é um modo humano e divino de Jesus nos dizer e nos mostrar que também Ele sofre e morre connosco, também Ele sofre e morre como nós e por nós. Mas Ele assegura-nos a palavra-chave da esperança: “Eu sou a Ressurreição e a Vida. Quem vive e crê em mim nunca mais morrerá” (Jo 11, 24-25). Nós sabemos que essa Palavra de Jesus se cumprirá, por inteiro, na manhã de Páscoa. Então, sim, Ele que morreu por nós, ressuscitará, para nos fazer ressuscitar a todos com Ele.
Senhor, se aqui estivesses meu irmão não teria morrido (Jo 11,21.32)!
Queridos irmãos e irmãs: é de morte e ressurreição, que nos fala este último sinal, realizado por Jesus antes de morrer: é já um anúncio e um prenúncio da sua própria morte e Ressurreição. Este sinal mostra-nos algo de belo e esperançoso: ali, onde se chora a morte, também floresce a vida. Estes dias tão difíceis oferecem-nos a mesma certeza: apesar das lágrimas, a vida triunfa da morte! Vemo-los em tantas pessoas que, no medo, reagiram oferecendo a vida: no padre italiano que cedeu o seu ventilador e morreu para salvar uma vida mais jovem; vemo-lo nos inúmeros médicos, enfermeiros, trabalhadores de supermercado, pessoal de limpeza, transportadores, forças de segurança; vemo-lo na generosidade dos voluntários, que dão o corpo às balas e arriscam a vida, na luta contra este maldito vírus. Vemo-lo na conversão de tantas pessoas, que despertaram para um novo modo de ver e de viver a vida. Esta é a força da Ressurreição que emerge dos escombros da morte(cf. EG 276). É uma força sem igual. Estas pequenas flores de esperança, que crescem nas asperezas do caminho, são um sinal primaveril e a promessa de uma Páscoa, que não nos será tirada. “Porque, com Deus a vida nunca morre"(Papa Francisco, Meditação, 27.03.2020).
Pe. Amaro Gonçalo