Homilia no II Domingo da Quaresma B 2018
«O amor não procura o próprio interesse» (1 Cor 13,5)
1. Na escada da Cruz, no caminho do amor, sobe-se descendo, ganha-se perdendo, alcança-se renunciando! Que o diga Abraão, que sobe o monte Moriá, para uma verdadeira prova de fogo! O homem, cujo nome se escreve com Amaiúsculo, deixara já a sua terra e os seus bens, para ser pai de um grande povo. Mas agora há ainda uma última posse, de que Abraão tem de ser libertado: a de Isaac, a quem chama «meu» filho (Gn 22,7-8). Subindo o monte Moriá, Abraão desce até ao abismo, empreende um caminho de renúncia total, dispondo-se a entregar o seu único filho, renunciando assim ao seu modo tão humano de o possuir. Em vez de sacrificar Isaac, Abraão deverá sacrificar sobretudo a sua vontade de o possuir como seu, como propriedade sua. Abraão passa a prova exatamente porque «não reteve o seu filho» (Gn 22,12.16). Deu-o. Desapossou-se dele. Deu-o a Deus e deu-se a Deus. E assim Abraão põe em evidência que a verdadeira fé purifica o amor, liberta-o de todas as amarras e alarga-lhe os horizontes, para que não se torne um amor possessivo, mas oblativo, porque «o amor não procura o próprio interesse», «o amor não procura o que é seu» (1Cor 13,5). O amor não sacrifica os outros, mas sacrifica-se pelos outros.
2. “Fora da Cruz, não há outra escada por onde se suba ao céu” (CIC 618), recordamo-lo, semana a semana, nesta longa caminhada, pela escada da Cruz, na qual se sobe descendo e se desce subindo. E essa é também a experiência de Jesus, com os três discípulos, no monte santo do Tabor. Concluída a subida, é oferecida aos discípulos a antevisão da glória prometida, a luz transfiguradora da ressurreição. Todavia, os mesmos terão de descer do alto do monte, para abraçar, com Jesus, a sua Cruz, e subir com Ele até ao lugar do Calvário. Pedro queria “reter” para si aquele momento de glória, falseando os degraus da escada da Cruz, mas terá agora de os descer um a um e «renunciar aos seus próprios interesses, para ter em conta os interesses de Deus» (Mc 8,33), porque, também aqui, «o amor não procura o próprio interesse» (1 Cor13,5).
3. Na Cruz, Deus dá testemunho do amor que Se entrega, até ao dom extremo da própria vida. Na Cruz, Deus não olha aos Seus próprios interesses, «não poupa o Seu próprio Filho» (Rm 8,31-34), mas entrega-O à morte por todos nós, para que no dom daquela vida oferecida alcance para nós a vida que tínhamos perdido.
4. Nesta 2.ª semana da Quaresma, “movidos pelo amor que se entrega na Cruz” deixemos transfigurar a nossa vida familiar e comunitária, através do exercício deste amor, que não se busca a si mesmo, que não procura a sua vontade, utilidade, comodidade ou prazer, porque “é próprio da caridade querer mais amar do que ser amado”. Um pai, uma mãe… amam o seu filho, muito antes e muito para além dos seus méritos e desejos. Amam-no gratuitamente «sem nada esperar em troca» (Lc 6,35), até àquele amor maior, que é sacrificar-se e «dar a vida» pelos outros (Jo 15,13). É em casa, a começar pela família, e a partir do exemplo de amor dos pais entre si e do amor dos pais aos filhos, que estes aprendem, na prática, a gratuidade do amor, a dar tudo e a vida toda pelos outros e até ao fim, segundo o mandato de Jesus:«Recebestes de graça, dai de graça» (Mt 10,8).
5.Para vivermos este amor não interesseiro, mas livre e gratuito, rezemos como São Francisco de Assis: “Ó Mestre, fazei que eu procure mais consolar que ser consolado; mais compreender que ser compreendido; mais amar que ser amado. Pois é dando que se recebe, é perdoando que se é perdoado, e é morrendo que se vive para a vida eterna”.É descendo que se sobe pela escada da Cruz, “de glória em glória” (2 Cor 3,8), até sermos transfigurados, à imagem de Cristo Ressuscitado!
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