Homilia no XXXIV Domingo Comum A 2017 – 1.ª fórmula
1.Celebrámos, no passado domingo, o 1.º Dia Mundial dos Pobres, segundo o desejo do Papa Francisco, “como a mais digna preparação, para bem viver a Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo, que Se identificou com os mais pobres e nos há de julgar sobre as obras de misericórdia” (Misericordia et misera, 21). Temos aqui, na cena do juízo final, o nosso verdadeiro “CR7”, o nosso Cristo Rei, que Se conhece e reconhece nas 7 obras de misericórdia, que a Igreja agrupou em corporais e espirituais. O Papa Francisco propõe-nos que cada um ponha em prática, todos os dias, uma destas obras de misericórdia. Assim faremos a verdadeira revolução do mundo e receberemos como herança o Reino dos Céus!
2.Mas há uma outra proposta ousada e oportuna do Papa Francisco, quando pensamos no estado de seca severa ou extrema, que se vive no nosso país. Na sua Mensagem para o Dia Mundial do Cuidado da Criação em 1 de setembro de 2016, o Papa acrescentou aos dois elencos das sete obras de misericórdia, uma oitava: o cuidado da Criação. Como obra de misericórdia corporal, “o cuidado da casa comum requer aqueles simples gestos quotidianos, pelos quais quebramos a lógica da violência, da exploração, do egoísmo, e que manifesta o amor em todas as ações que procuram construir um mundo melhor”. Como obra de misericórdia espiritual, “o cuidado da casa comum requer a grata contemplação do mundo, que nos permite descobrir qualquer ensinamento que Deus quer transmitir através de cada coisa”.
3. Na sua encíclica social sobre a ecologia integral (Laudato si’), o Papa deixou-nos recomendações muito concretas: “Se uma pessoa habitualmente se resguarda um pouco mais com roupa, em vez de ligar o aquecimento, embora as suas economias lhe permitam consumir e gastar mais, isso supõe que adquiriu convicções e modos de sentir favoráveis ao cuidado do ambiente. É muito nobre assumir o dever de cuidar da criação, com pequenas ações diárias, tais como evitar o uso de plástico e papel, reduzir o consumo de água, diferenciar o lixo, cozinhar apenas aquilo que razoavelmente se poderá comer, tratar com desvelo os outros seres vivos, servir-se dos transportes públicos ou partilhar o mesmo veículo com várias pessoas, plantar árvores, apagar as luzes desnecessárias… Tudo isto faz parte de uma criatividade generosa e dignificante, que põe a descoberto o melhor do ser humano” (LS 211). Na verdade, não é pelo facto de eu poder pagar a conta da água e da luz ou da comida com fartura, que tenho direito a dar azo ao meu impulso consumista! Porque chegará um dia em que de nada me servirá ter dinheiro, quando não houver água, luz ou o grão de trigo na terra, para comprar e pagar.
4. São desafios a um estilo de vida mais pobre e mais simples que as recentes alterações climáticas reclamam, lembrando-nos que Deus perdoa sempre, o homem perdoa às vezes, mas a natureza nunca perdoa! Sentimos agora a falta da chuva e as suas consequências dramáticas.Hoje mesmo rezaremos a pedir chuva! Mas rezar não significa renunciar à responsabilidade e ao compromisso, no cuidado pela pureza da água e na sobriedade do seu consumo. Pelo contrário, refresca em nós a consciência de tal dever. Quando pedimos a chuva, recordamo-nos que não temos o direito de abusar dos gastos da água, que é um bem de primeira necessidade, e que devemos rever uma série de comportamentos, que põem em risco esta bênção, que vem dos Céus e é destinada a todos. “O acesso à água potável e segura é um direito humano essencial, fundamental e universal” (LS 30).
5. Não rezemos para que Deus interfira na ordem da sua própria Criação, mas rezemos para nos darmos conta da desordem introduzida pela nossa ação humana e que, em tantos casos, só Deus pode reparar e recriar. Porque a água da chuva é dom e bênção, invoquemos sempre o Senhor, começando por pôr em prática a oitava obra de misericórdia: cuidar com amor da nossa Casa comum!
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HOMILIA NA SOLENIDADE DE CRISTO, REI A 2017 – 2.ª fórmula
1.Celebrámos, no passado domingo, o 1.º Dia Mundial dos Pobres, segundo o desejo do Papa Francisco, “como a mais digna preparação, para bem viver a Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo, que Se identificou com os mais pobres e nos há de julgar sobre as obras de misericórdia” (Misericordia et misera, 21). Neste ano pastoral 2017/2018, centrado na Caridade, o ensinamento de Jesus não nos permite vias de fugae é muito concreto: “Tive fome e destes-me de comer, tive sede e destes-me de beber, estava nu, era peregrino, estava doente e assististes-me” (cf. Mt 25,35-36).
2.Às vezes, passamos diante de situações de pobreza dramática, e parece que elas já não nos movem nem comovem; tudo continua como se nada fosse, numa indiferença que nos torna hipócritas. E, sem nos darmos conta, acaba numa forma de letargia espiritual, que torna o nosso espírito insensível e a nossa vida estéril.Por isso, ficar imóvel e não fazer nada de mal, não nos basta. Ganha aqui atualidade o esquecido pecado de omissão, o grande pecado contra os pobres, que alimenta o vírus da indiferença: «Isto não me diz respeito, não é problema meu, é culpa da sociedade». É passar ao largo quando o irmão está em necessidade, é mudar de canal logo que um problema sério nos indispõe, é também indignar-se muito com o mal nas redes sociais, mas sem fazer nada de concreto com aquele que jaz à nossa porta ou vive dentro de portas, na nossa casa, na nossa família, no nosso prédio, na nossa rua ou faz parte do nosso grupo de trabalho ou de amigos! Frequentemente são as pessoas mais próximas de nós aquelas que mais precisam da nossa ajuda. Comecemos, por elas, a prática artesanal das obras de misericórdia, bem a nosso jeito, abrindo as mãos sem medo de as sujar, arregaçando as mangas para aliviar o sofrimento dos mais pobres, dos mais pequeninos, com os quais Jesus não tem vergonha de Se identificar.
3.Mais uma semana, e entraremos no Advento, rumo ao Natal, movidos pela Estrela que brilha no amor. Seremos então desafiados a fazer o nosso pé-de-meia, para ajudar as famílias mais pobres e as vítimas dos incêndios. Seremos desafiados a construir a nossa vida, a nossa família e a nossa Igreja, à imagem do Presépio, “pobre de meios, mas rica no amor”. Queremos dar uma prenda ao Menino Jesus, que seja mesmo do seu agrado? Ele diz-nos a prenda que espera: «Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a Mim mesmo o fizestes» (Mt 25,40). No rosto dos pobres, de todas as pobrezas, materiais e espirituais, podemos imaginar impresso o rosto d’Ele; nos seus lábios, mesmo se fechados pela dor, escutamos as palavras d’Ele: «Isto é o meu corpo» (Mt 26,26). No pobre, Jesus bate à porta do nosso coração e, sedento, pede-nos amor! Não aconteça que Jesus passe por mim, numa dessas pessoas simples e necessitadase Eu não O reconheça. Os pobres são a verdadeira porta de entrada na Igreja e o nosso passaporte para o paraíso. Não são um problema; são um recurso de que lançar mão, para acolher e viver com autenticidade o Evangelho, para celebrar e viver dignamente a Eucaristia, para construir uma Igreja pobre de meios e rica no amor.
4.Movidos pelo amor de Deus, cuidemos com empenho (cf. Gl 2,10) dos nossos pobres, não só dando-lhes o pão, em géneros ou em dinheiro, mas também estando com eles, partilhando a sua sorte, repartindo com eles o pão da Palavra e da consolação. Amar o pobre significa lutar contra todas as pobrezas, a maior das quais é desconhecer a Cristo e não se sentir amadopelos irmãos.
5.Que o Espírito Santo nos inspire uma verdadeira fantasia da caridade, para identificar novas formas de pobreza deste mundo globalizado e novos modos de a combater. Comecemos por algo de muito simples: cada um pratique, todos os dias, em cada dia, pelo menos, uma das obras de misericórdia. Com isto, faremos a verdadeira revolução do mundo e receberemos como herança o Reino dos Céus!