Homilia no VII Domingo Comum A 2017
I. Degrau a degrau, o sermão da montanha põe-nos muito alta a fasquia do amor! E não se trata de uma medida alta para campeões, super-homens, extraterrestres ou heróis da banda desenhada! A santidade é a “medida alta da vida cristã comum” (NMI 31).E, por isso, Jesus não deixa de a propor a todos os Seus discípulos. A montanha que somos desafiados a escalar, faz-se subindo, degrau a degrau, o caminho da perfeição, que é afinal o caminho do amor.
II.Vou recordar-vos cinco degraus nesta escalada. Cada um examine-se, vendo bem a que distância se encontra do ideal cristão, do topo desta montanha.
Primeiro degrau: vingar o mal com um mal ainda maior. Nas primeiras páginas da Bíblia, encontramos vestígios da «lei da vingança», quando se diz: «Caim é vingado sete vezes, mas Lamec setenta vezes sete» (Gn 4,24). Aqui respira-se uma vingança irracional, um ódio descontrolado! Há restos disto naquela triste ameaça: «A vingança vai ser terrível»! Oh, quanto caminho há ainda por fazer, para chegar à não violência ativa, como forma de alcançar a paz!
Segundo degrau: pagar o mal com o mal. No livro do Êxodo encontramos a famosa «lei de talião»: “olho por olho, dente por dente” (Ex 21,24). Isto ainda nos parece qualquer coisa de muito bárbaro, mas, à época, era já um grande avanço: o agressor receberia apenas uma sanção igual àquela que provocara na vítima! Aqui há já um limite para a vingança, mas esta não desarma: «Cá me fazes, cá me pagas»! Oh, quão distantes estamos ainda de oferecer a outra face ao agressor!
Terceiro degrau: não fazer ao outro o mal que não se deseja para si mesmo. No livro de Tobias, encontramos esta “regra de ouro”: “Não faças aos outros o que não queres que te façam a ti” (Tb 4,15). Aqui a sentença é mais elevada, mas não vai longe: basta ficar quieto, não agir nem reagir…Estamos ainda a léguas daquele amor ativo, capaz de querer bem e de fazer o bem a quem nos faz mal!
Quarto degrau: fazer ao outro o bem que se deseja para si. Nos Evangelhos, a regra de ouro aparece-nos, formulada pela positiva. «Faz aos outros, o que queres que te façam a ti» (Mt 7,12; Lc 6,31). Só que, neste 4.º degrau, como no anterior, há ainda um vício de raiz: a referência e a medida do amor parece que sou eu! Ora é preciso romper este circuito fechado do amor, para que a medida seja maior.
E eis que vem o degrau mais alto: o mandamento novo: «Amai-vos uns aos outros, como Eu vos amei» (Jo 13,34).Aqui a medida já não sou eu. Aqui a medida é Jesus, o Jesus da Cruz. Aqui o amor é incondicional, sem retorno, até ao fim! Aqui o amor é responder à violência com a ternura, rompendo o ciclo da vingança. Aqui o amor é responder à soberba, com o excesso do dom, desatando o nó cego do egoísmo. Aqui a regra é esta: todo o “desamor com amor se paga e apaga”.
III. E perguntareis, no fim de tudo isto: é-nos possível chegar ao topo da montanha e alcançar o TOP deste amor aos inimigos? Jesus deixa-nos uma dica importante, quando diz: «Orai pelos que vos perseguem». Sem oração, não vamos lá. A oração é a única arma que nos desarma, porque a oração transforma os nossos sentimentos e até a vontade, à imagem de Deus Pai, “quefaz nascer o sol sobre bons e maus”, à imagem do Filho, que respondeu à violência da Cruz com a oferta da vida, e à imagem do Espírito Santo, que é amor sem medida. Pela oração, alcançamos uma nova visão, que nos faz ver Deus como Pai e o outro como irmão.
IV. Vê bem em que degrau te encontras. Vai subindo, um de cada vez, de mãos dadas à Cruz do Senhor. Não fiques caído no vão da escada! Prossegue a escalada do amor! E reza:“Dá-me, Senhor, o que mandas e então manda o que quiseres” (Santo Agostinho, Confissões X, 29,40)!