Homilia no XIX Domingo Comum C 2016 – Início da Semana Nacional das Migrações
Nota: estarei ausente da comunidade paroquial, neste domingo. A homilia que se segue é apenas uma proposta de reflexão a partir da 2.ª leitura, com ligação à temática da Semana das Migrações. Também a Oração dos fiéis se inspira na Mensagem para o Dia do Migrante e Refugiado.
1.A grandiosa figura de Abraão, nosso pai na fé, um arameu errante, é a imagem bíblica do homem peregrino, em busca da Terra Prometida… em demanda dessa “cidade cujo arquiteto e construtor é Deus”. Essa “cidade de Deus” é o sonho do Reino, que somos chamados, por Deus, a construir, no nosso metro quadrado, na nossa cidade, em cada canto e recanto do mundo, que é casa comum de todos os povos, onde habitamos como peregrinos, sem morada permanente. Portanto, na origem da nossa história de salvação, está um pai na fé, um patriarca, que é um peregrino, um emigrante, enfim, um estrangeiro, com um coração tão grande como o seu nome de Abraão.
2.Como podemos então viver a nossa fé, assumir a nossa condição de crentes, de peregrinos da Terra da Promessa, sem ver nem reconhecer, no estrangeiro, no peregrino, no refugiado, o semblante do rosto de Deus, que, em Jesus Cristo, Se fez hóspede e peregrino no meio de nós?! O nosso Deus é um Deus que Se identifica com os cansados peregrinos, com os sem teto, os sem-terra, os sem trabalho. Em cada uma destas pessoas, é Deus que pede para ser acolhido, amado e reconhecido, é Cristo que passa pela nossa vida e bate à porta, para entrar e cear connosco (Ap 3,20). “Os migrantes são nossos irmãos e irmãs que procuram uma vida melhor longe da pobreza, da fome, da exploração e da injusta distribuição dos recursos do planeta, que deveriam ser divididos equitativamente entre todos”.Neste sentido, acentua o Papa, na sua Mensagem, que inspira o lema desta semana, «os emigrantes e refugiados interpelam-nos». E – diz ele – “a resposta do Evangelho”, face a estes “pequeninos”, que são hoje os mais pequeninos dos pequeninos “é a misericórdia (…) A misericórdia alimenta e robustece a solidariedade para com o próximo”, torna-nos “guardiães dos nossos irmãos e irmãs, onde quer que vivam. O cultivo de bons contactos pessoais e a capacidade de superar preconceitos e medos são ingredientes essenciais para se promover a cultura do encontro, onde cada um esteja disposto não só a dar, mas também a receber dos outros. De facto, a hospitalidade vive do dar e receber” (Ibidem).
3.Desta hospitalidade, que era dever sagrado de todo o judeu, e que figura entre as obras de misericórdia corporais do cristão, Abraão é modelo e exemplo, quando recebe generosamente em sua casa três figuras misteriosas, como escutávamos há três domingos atrás (cf. 1.ª leitura do XVI Domingo Comum C). Aliás, toda “a revelação bíblica encoraja a receção do estrangeiro, motivando-a com a certeza de que, assim fazendo, abrem-se as portas a Deus e, no rosto do outro, manifestam-se os traços de Jesus Cristo”. Por isso, “acolher o outro é acolher a Deus em pessoa” (Ibidem).
4.Recentemente na Polónia, o Papa insistiu, mais uma vez, na necessidade de abrir pontes e derrubar muros, no dever de acolher quem foge da guerra ou quem sai de um país, à procura de uma vida melhor, vencendo medos injustificados e especulações sobre a pele dos estrangeiros, dos emigrantes e refugiados. E isto, não raro, também se vive em algumas comunidades paroquiais, que veem ameaçada a tranquilidade tradicional.
5.Este tempo de férias seja também um tempo para a hospitalidade, para o contacto partilhado com os turistas, com os emigrantes, com pessoas e culturas diferentes! Em cada pessoa que passa, Deus deixa um ar da sua graça! Não deixemos que passem em vão! Porque em cada um deles mora Deus, que Se revela no rosto de um irmão!