Homilia no XI Domingo Comum C 2016 – Ano da Misericórdia
Amor ou julgamento! Perdão ou condenação! Misericórdia ou justiça! Eis o verdadeiro fundo da questão, que está em cima da mesa, em discussão! Meditemos nesta belíssima cena do Evangelho, precisamente aquela que inspirou o Papa a anunciar, pela primeira vez, e ao mundo, o Ano da Misericórdia (cf. Celebração penitencial «24 horas para o Senhor», 13.03.2015). E fixemo-nos em três pontos, olhando para as três figuras:
1. Certamente fixastes sobretudo o olhar do coração no amor daquela mulher pecadora, que se humilha diante do Senhor; mas reconhecereis que ainda antes, e acima do seu amor, há o amor misericordioso de Jesus por ela. É a certeza desse amor de Jesus, que a estimula a aproximar-se. O seu amor a Jesus é, no fundo, a resposta ao amor de Jesus, que primeiro a amou: primeiro, porque a ama desde toda a eternidade; e primeiro porque a ama infinitamente mais. É porque tem confiança neste Amor inesgotável, que a mulher entra pela porta dentro e, sem dizer palavras, multiplica-se em gestos gratuitos, sem preço, nem medida. E cada gesto de amor daquela mulher exprime simplesmente o desejo e a certeza de ser perdoada.
2. Esta certeza é inabalável, porque o amor e o perdão são simultâneos: Deus perdoa-lhe muito, perdoa-lhe tudo, porque ela «amou muito» (Lc 7,47). É grande o perdão de Deus, que lhe faz graça, e quanto maior é o perdão, maior é o amor; quanto maior for a graça da dívida perdoada, maior será a gratidão do coração! Para esta mulher, não haverá juízo algum, a não ser o que vem de Deus, e este juízo é misericórdia. O protagonista deste encontro é, pois, aqueleamor de Jesus, que vai sempre além da justiça, que oferece o perdão, esse dom perfeito, oferecido e correspondido. Jesus misericordioso é pois a figura principal!
3. E, em contraluz, aparece-nos a triste figura de Simão, o fariseu, o dono da casa, que não consegue encontrar o caminho do amor. Tudo é calculado, medido a rigor. Este fariseu não se sente, junto de Jesus, um doente, carente de remédio e de cura, e por isso não aceita que o médico divino Se aproxime dos pecadores; ele sente-se, pelo contrário, justo credor de direitos, um obreiro merecedor de grande recompensa. Ele não se julga necessitado de perdão. Ele acha-se justificado, pelas obras da lei! Ele não pensa que é salvo pelo facto de Deus ser bom, mas porque ele é bom. Ele nunca tropeça, porque verdadeiramente nunca arrisca no amor. Não conhece, por isso, o pecado e, nessa medida, desconhece o perdão. Precisaria de cair, para pedir a mão e se levantar, para conhecer a graça imensa do perdão. Mas não. O seu olhar é só de condenação. Não é capaz de ver o coração, nem de pôr o coração a ver. Por isso, aquela mesa, que podia ser lugar de perdão e de comunhão, torna-se, para ele tribuna de julgamento e condenação.
4. Irmãos e irmãs: nunca nos precipitemos a julgar ninguém, olhando à superfície. “Não julgar nem condenar significa, de modo positivo, ver o que há de bom em cada pessoa e não permitir que venha a sofrer pelo nosso juízo parcial e a nossa pretensão de saber tudo” (MV 14). Martin Luther King escreveu: «mesmo a pessoa que mais te odeia, tem algo de bom nela. E, quando chegas ao ponto de fixar o rosto de cada ser humano e, bem no fundo dele, vês a “imagem de Deus”, começarás, apesar de tudo, a amá-lo. Não importa o que faça, lá vês a imagem de Deus. Há um elemento de bondade, de que nunca poderás livrar-te” (cit. AL 118).
5. Na verdade, queridos irmãos e irmãs, quando passamos o tempo a julgar as pessoas, deixamos de ter tempo para as amar! Não nos precipitemos a julgar, mas peçamos ao Senhor, olhos misericordiosos! E deixemos, também, entreaberta a porta da Igreja, para quem quiser entrar e encontrar aqui a graça do perdão de Deus, que Se oferece, sem despesa, na alegria desta mesa do Senhor!
Homili na Festa da Profissão de Fé 2016
«A tua fé te salvou» (Lc 7,50). E quantas vezes ouvimos esta frase, na boca do povo, dita deste modo: «a fé é que nos salva». Esta afirmação é verdadeira. Mas é preciso que compreendamos bem o que ela significa e implica. E o Evangelho deste domingo, em pleno Ano da Misericórdia, mostra-nos que “tipo de fé” é esta, que verdadeiramente nos salva.
1. Em primeiro lugar, é uma fé, que não põe a confiança nos próprios méritos ou nas boas obras, mas em Deus.
A fé implica pôr a confiança no Senhor, apoiar-se n’Ele, como uma rocha inabalável. A fé implica saber e saborear, conhecer e reconhecer o amor de Deus e deixar-se amar por Ele. Quem ama primeiro, no tempo e na intensidade, é sempre o Senhor. Aquela mulher, por exemplo, aproxima-Se de Jesus porque acredita que o Senhor a ama, desde sempre; ela crê e confia que o Senhor lhe perdoará os seus pecados, porque a Sua misericórdia é infinita. É porque está confiante no amor misericordioso do Senhor, e não nas suas virtudes e méritos, que ela se aproxima e realiza todos aqueles gestos de humildade, de gratidão, de amor.A fé é isto mesmo: corresponder, com amor, ao amor de Deus, que me ama primeiro. Pela fé, sei que sou salvo, não por eu ser bom, mas porque Deus é bom!
2. Em segundo lugar, é uma fé que se compromete com Jesus.
Aquela mulher deixa-se tocar e transformar pelo amor de Jesus. Converte-se. Muda de vida. E torna-se servidora de Jesus, como tantas outras mulheres que serviam Jesus com os seus bens. Quando a fé é verdadeira, ela traduz-se sempre numa vida nova, numa vida renovada, num compromisso com Jesus e num serviço aos outros. Ora, o primeiro compromisso dos amigos de Jesus é estar à mesa com Ele, em cada domingo. É à volta da mesa, que Jesus nos fala ao coração, que nos alimenta, que nos transforma, dia a dia, semana a semana. Quem tem fé, professa a fé, isto é, mostra, de viva voz, e no concreto, em cada domingo, quem é o Seu Senhor. Não é o futebol. Não é o computador. Não é o monte ou o mar. É Jesus. E, por isso, que tem fé, não deixa de Se aproximar de Jesus, desta mesa da Palavra, do Perdão, da Eucaristia. Não façamos desta mesa, como o fariseu, um lugar raro, de vaidade, de superioridade, mas um lugar de encontro familiar.
3. Por último, esta fé não tem medo de se expor, de cair no ridículo, de ser julgada.
Aquela mulher atreveu-se a realizar gestos de grande hospitalidade e generosidade, de grande humildade e ternura, que escandalizaram o fariseu, que é aqui a figura dos que estão sempre prontos a condenar e a dizer «vais à Igreja, vais à missa, vais à catequese, e és pior do que os outros». Ora, nós temos de ter a coragem de atravessar a rua, de entrar nesta casa, de vir a esta mesa, mesmo que, do lado de fora, nos olhem com desdém, com desprezo. Nós amamos Jesus e deixamo-nos amar por Ele.
Queridos catequizandos:
1. Professar a fé implica dizer, de viva voz, com palavras, mas sobretudo com gestos de generosidade, de ternura e amor, que só Deus é o Senhor e só o Seu amor nos pode salvar. Somos pecadores e vimos aqui precisamente porque precisamos de perdão. E este encontro deixa-nos sempre o perfume, o suave odor da compaixão de Cristo.
2. Continuai aqui, connosco, a crescer na fé. A fé que professais, nesta idade, precisa de ganhar profundidade, para se tornar uma luz, que ilumina e guia a vossa vida. Cada um de vós é chamado a mostrar e a dizer aos outros, como São Paulo: «Vivo animado pela fé no Filho de Deus, que me amou e Se entregou por mim» (Gl2,20)!