Homilia na Festa de São Martinho 11.11.2025
Destaque

Reunimo-nos para celebrar a Festa em honra do nosso Padroeiro São Martinho.Martinho nasceu na Panónia, no território da atual Hungria, por volta do ano 316. Nascido de pais pagãos e, chamado ao serviço militar na Gália, quando era ainda catecúmeno, cobriu, com o seu manto, a Cristo na pessoa de um pobre. Depois de receber o Batismo e de renunciar à carreira militar, fundou um mosteiro em Ligugé, na França, onde levou vida monástica, sob a direção de santo Hilário de Poitiers. Depois, foi ordenado presbítero e, mais tarde, eleito bispo de Tours. Foi modelo insigne de bom pastor: fundou mosteiros e paróquias, dedicou se à formação e reconciliação do clero e à evangelização dos povos rurais. Morreu em Candes, no ano 397. Santo muito popular, é o primeiro confessor não mártir a ser venerado com rito litúrgico. O dia 11 de novembro é a data da deposição do seu corpo. Que a celebração desta Festa nos inspire a esperança do céu e da vida eterna e o amor concreto aos pobres, que são para nós a Carne de Cristo! 

HOMILIA (SERMÃO) NA FESTA DE SÃO MARTINHO 11.11.2025

Celebramos esta Festa em honra do nosso Padroeiro, São Martinho, dentro de vários contextos, dos quais destacamos dois: o mês de novembro e o 9.º Dia Mundial dos Pobres.

1. O primeiro contexto é o do mês de novembro, que começou por nos pôr os olhos no céu (dia 1 – Todos o Santos) e os olhos na terra (dia 2 – Fiéis defuntos), recordando-nos assim a meta a que o pó da nossa frágil humanidade aspira: a santidade e a felicidade plena na comunhão com Deus. A visita ao cemitério pôs-nos de frente à realidade da morte, mas também exercitou em nós a virtude da grande esperança na ressurreição, na vida eterna. A 1.ª leitura fala-nos precisamente desta esperança na ressurreição, com a linguagem da filosofia grega, que a traduz por imortalidade da alma: “Aos olhos dos homens os que morreram sofreram um castigo, mas a sua esperança estava cheia de imortalidade”. Se a morte parece um fracasso, uma derrota, um aniquilamento, na verdade ela é Páscoa, é passagem, é consumação da vida, é porta aberta para uma vida outra. A esperança do crente vive da confiança de quem se entrega às mãos de Deus, que nos torna dignos de Si, que nos chama a Si. Doravante, na comunhão plena de vida e de amor, nas mãos de Deus, “nenhum tormento nos atingirá” (cf. 1.ª leitura).

2. É belo, neste primeiro contexto, recordar a forma como o escritor Sulpício Severo – na obra “Vita Martini” – descreve a morte de São Martinho no ano de 397: “(…) nem teve medo de morrer nem se furtou a viver! Entretanto, com as mãos e os olhos sempre elevados para o céu, o seu espírito invencível não abandonava a oração. Quando os presbíteros, que se tinham reunido à sua volta, lhe pediram para aliviar o seu pobre corpo mudando de posição, disse: «Deixai me, irmãos, deixai me olhar antes para o céu do que para a terra, para que a minha alma, ao iniciar a sua marcha para Deus, siga bem o seu caminho». Ao dizer isto, reparou que o diabo se encontrava perto. «Porque estás aqui, disse, besta sanguinária? Nada encontrarás em mim, maldito; o seio de Abraão me recebe». Depois de pronunciar estas palavras, entregou o seu espírito ao Céu. Martinho, cheio de alegria, foi acolhido no seio de Abraão. Martinho, pobre e humilde, entrou rico no Céu”.  Figuras assim, com esta grande vida e esta bela morte – diz a Sabedoria – “hão de resplandecer, correndo como centelhas através da palha” (cf. 1.ª leitura). O seu testemunho de santidade foi tal, que rapidamente o seu culto se propagou por toda a Europa e fora dela. São Martinho tornou-se o primeiro santo não mártir a ser canonizado.

3.O segundo contexto desta Festa é o da celebração do 9.º Dia Mundial dos Pobres, no próximo domingo.Fixemo-nos nesta conclusão: “Martinho entrou pobre e humilde entrou rico no reino dos céus”. São Martinho seguiu verdadeiramente a Cristo, Aquele que, sendo rico, se fez pobre por nós, para nos enriquecer com a sua pobreza (cf. 2 Cor 8, 9). O espírito de pobreza fê-lo não apenas repartir a sua capa, quando era ainda catecúmeno, mas fê-lo abraçar a vocação eremítica e monástica, por volta do ano 360, antes ainda de se tornar Bispo: ele quis ser pobre com os pobres, ser pobre pelos pobres, ser pobre por amor ao sumamente Pobre, que é Jesus Cristo. Assim se percebe que “a vida monástica, nascida no silêncio dos desertos, foi desde o início um testemunho de solidariedade. Os monges deixavam tudo – riqueza, prestígio, família – não só por desprezar as riquezas do mundo, mas para encontrar, neste despojamento radical, o Cristo pobre” (DT 54).Mais ainda, essa renúncia a não ter nada destinava-se a ter alguma coisa para os pobres,«a fim de que, por nosso intermédio, Deus forneça o bastante aos irmãos mais fracos» (Regra de São Basílio Magno)” (DT 54). Segundo a regra de São Basílio, “para estar perto de Deus é preciso estar próximo dos pobres”.

4.  Nós nem devíamos precisar que o Papa Francisco tivesse criado o Dia Mundial dos Pobres, para nos recordar o vínculo inseparável entre a vida da fé e o cuidado dos pobres. Do Antigo ao Novo Testamento, do início da missão da Igreja até hoje, é, por de mais evidente, a opção preferencial de Deus, de Cristo, da Igreja, pelos pobres. Escutávamo-lo há pouco na grande parábola do juízo final (cf. Mt 25, 31-46): «O que fizestes a um dos meus irmãos mais pequeninos a Mim o fizestes». Neste texto encontramos precisamente uma regra de comportamento, com base na qual seremos julgados» (cf. DT 28; GE, 95): o amor aos pobres. Na recente Exortação apostólica «Dilexit te» (DT) fica claro que “a dimensão social do cuidado integral dos mais pobres, frágeis e vulneráveis, é parte fundamental da missão da Igreja e da sua opção preferencial pelos mais pobres. Por isso, “não devemos baixar a guarda diante da pobreza” (DT 12) de todas as pobrezas (cf. DT 9). O Papa Leão XIV insiste num “vínculo indissolúvel entre a nossa fé e os pobres” (DT 17), e que, portanto, “o cuidado aos pobres é uma prova concreta da sinceridade da fé” (DT 45). Na sua perspetiva, “o exercício da caridade é o núcleo incandescente da missão eclesial” (DT 15). “Muitas vezes pergunto-me – diz Leão XIV– quando há tanta clareza nas Sagradas Escrituras a respeito dos pobres, por que razão muitos continuam a pensar que podem deixar de prestar atenção aos pobres” (DT 23). O Documento Final do último Sínodo dos Bispos recorda que “é necessária uma criatividade missionária que identifique caminhos concretos de cuidado” (DF 111) e que não esqueça a pessoa em todas as dimensões, inclusive na dimensão espiritual, pois “a pobreza mais grave é não conhecer a Deus” (Papa Leão XIV, MDMP 2025, n.º 4).

Irmãos e irmãs:  Precisamos de ser criativos, para não reduzir a nossa ação pastoral junto dos pobres a mera assistência na urgência (DT 94; cf. EG 202). “O cristão não pode considerar os pobres apenas como um problema social: eles são uma questão familiar. Pertencem aos nossos (…) Os pobres não são um passatempo para a Igreja, mas sim os irmãos e irmãs mais amados, porque cada um deles, com a sua existência e também com as palavras e a sabedoria que trazem consigo, levam-nos a tocar com as mãos a verdade do Evangelho” (Papa Leão XIV MDMP, n.º 5). Por isso, “o Dia Mundial dos Pobres pretende recordar-nos que todas as formas de pobreza, sem excluir nenhuma, são um apelo a viver concretamente o Evangelho e a oferecer sinais eficazes de esperança” (Papa Leão XIV, MDPM 2025, n.º 5). Esse é o legado que nos deixará o Jubileu de 2025: oferecer aos mais frágeis, razões e sinais palpáveis de esperança, que testemunhem a caridade cristã, como o fez São Martinho.

5. Irmãos e irmãs: somos uma Igreja pobre, uma Paróquia: pobre de meios, mas rica de pessoas, rica de amor. Somos uma Paróquia onde há muitos pobres e pobres de toda a espécie de pobrezas. Temos de fazer como São Martinho: cuidar da própria capa (da cobertura da capela mortuária, do salão paroquial, da Igreja Matriz, da Igreja da Sagrada Família) sem deixar de cuidar da capa da dignidade daqueles que não têm pão, cultura, fé, companhia, saúde, direitos. “Não podemos honrar o Corpo de Cristo se permitimos que ele seja desprezado nos seus membros, isto é, nos pobres que não têm que vestir” (São João Crisóstomo; cit. DT 41). Assim, irmãos e irmãs, a Festa de São Martinho, “no mês das almas” e nas vésperas do 9.º Dia Mundial dos Pobres nos recorde a todos: os pobres são dos nossos! Através das suas vozes, das suas histórias, dos seus rostos, Deus assumiu a sua pobreza, para nos tornar ricos a seus olhos. Isto mesmo aprendamos e imitemos de São Martinho, o qual “pobre e humilde, entrou rico no céu”.

 

 

 

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