Homilia no XVII Domingo Comum B 2024
4.º Dia Mundial dos Avós e dos Idosos
O calor do verão não é favorável à longa degustação do pão substancial da homilia, pelo que gostaria de deixar apenas três migalhas de reflexão, três verbos de ação, no contexto deste tempo de férias e deste 4.º Dia Mundial dos Avós e Idosos (4DMAI). Os três verbos são estes: repartir, recolher e retirar-se.
1. Repartir. Nem por uma vez se fala de multiplicação dos pães ou dos peixes. Fala-se, em jeito de provocação inicial, sobre “onde havemos de comprar pão para lhes dar de comer” (Jo 6,5), mas logo anota o evangelista que Jesus bem sabia o que ia fazer. Enquanto os discípulos pensam nas compras e raciocinam em termos de mercado, Jesus substitui a lógica comercial do comprar e do vender pela lógica fraterna do dar e do doar. E, por isso, os verbos mais usados no texto são tomar, partir, dar, distribuir, os verbos da Última Ceia e da Eucaristia. O verdadeiro milagre não é, pois, o da multiplicação que produz ostentação e poder, mas o da divisão, da partilha, que aumenta o amor e permite que Deus faça maravilhas. Neste tempo de férias, o verbo partir deve ser declinado e reciclado no verbo repartir. Sejam as férias, oportunidade de partir de casa para sair de si, repartindo o tempo, os bens, a vida com os outros. E, no contexto deste 4DMAI, não deixa de ser curioso que na base deste milagre da abundância esteja aquele tão pouco dos 5 pães e dos dois peixes, partilhados por um jovem. Precisamos de partilhar o tesouro comum da vida, de sonhar juntos. Sem esta aliança de vida, de sonhos, de futuro, entre as várias gerações, corremos o risco de morrer de fome. Aprendamos a partilhar o tempo com os avós e idosos.
2. Recolher.“Recolhei os bocados que sobraram, para que nada se perca” (Jo 6,12). O que é que sobra para nós naqueles 12 cestos cheios? Não são umas sobras quaisquer: é o Pão da Palavra, é o Pão da Vida, é o Pão que é verdadeiramente o Corpo de Cristo. Este Pão – seja o Pão nosso de cada dia seja o Pão Vivo da Eucaristia – não pode ser descartado, esbanjado. Pensando nas férias, eu diria que este não pode ser um tempo para o desperdício, para gastar no que não sacia (cf. Is 55,1-2), mas um tempo favorável para recolhermos tudo o que sobrou deste ano: memórias, experiências, aprendizagens, tantos dons recebidos. Precisamos, nas férias, de voltar cada domingo à celebração da Eucaristia, para recordarmos e agradecermos todos esses dons, para os recolhermos e saborearmos em nosso coração. E, se pensarmos em tudo isto, na perspetiva deste 4DMAI, eu diria: aprendamos dos avós e idosos a não desperdiçar nada, mas sobretudo não os desperdicemos a eles, não os descartemos como «sobras» da família ou da sociedade. Saibamos recolher os avós e os idosos em nossa casa, em nosso coração. Eles são aqueles preciosos pedaços de pão, deixados na mesa da nossa vida, que nos podem alimentar com a fragrância da memória e da misericórdia. Não os abandonemos à solidão! Guardemo-los, para que nada se perca da sua vida e dos seus sonhos.
3. Retirar-se.Por fim, diz o Evangelho, Jesus retirou-se novamente sozinho para o monte (Jo 6,15). Não se pode recolher nada da vida, se não formos capazes de nos recolhermos, de nos retirarmos a sós, com Deus, com o Pai. É no coração de Deus Pai, e não no mercado ou no shopping, que compramos, sem dinheiro e sem despesa, o pão, o vinho, o leite (Is 55,1-2), isto é, aquilo que nos preenche e sacia o coração. Pensando agora neste 4DMAI, talvez o colo do avô, da avó, ainda possa ser um lugar de paz e de recolhimento. Sejamos agradecidos “pelos seus joelhos que nos deram colo, pelas suas mãos que nos acompanharam e levantaram, pelos jogos que fizeram connosco e pelas carícias com que nos consolaram” (Papa Francisco)!
Em pleno Ano da Oração, sejam as nossas férias um tempo em três tempos: para partir de si e repartir a vida com quem está só; um tempo para recolher memórias e graças; um tempo de retiro, para verdadeiramente repousar no Senhor.