Homilia no XXVIII Domingo Comum C 2022
«Peço-te que aceites um presente deste teu servo»!
1. É o pedido humilde (cf. 2 Rs 5,15) de um general sírio, um estrangeiro, um pagão, que foi purificado da lepra, através do repetido mergulho, por sete vezes, nas águas do Jordão. A cura não é nenhum efeito miraculoso da água das Sete Bicas, mas fruto da obediência humilde de um estrangeiro à Palavra do Senhor. Naamã é um homem de coração cheio, maravilhado, agradecido, desejoso de oferecer ao profeta um presente, uma recompensa. Ele sabe que um dom só é plenamente acolhido quando é reconhecido. Mas, curiosamente, em resposta, Eliseu, o profeta de Deus, não abraça o presente. Essa oferta de um sinal, que testemunha a sua fé e a sua gratidão, deve ser reencaminhada para outro destinatário: não para ele, mas para o Senhor, de quem procede todo o dom perfeito! Por isso, apesar das insistências, diz o texto, Elias recusou o presente.
«Peço-te que aceites um presente deste teu servo»!
2.Apetecia-me agora censurar Eliseu por ter recusado o presente e dizer-lhe que isso não se faz. Todavia, terei de reconhecer em Elias algum motivo, para esta recusa. Elias – a meu ver – quer manter-se íntegro. Por isso, fica de “pé atrás” quanto a um possível presente envenenado pela corrupção, quando se quer que uma mão lave outra mão e a gratidão se transforme num negócio de retorno garantido. Ora, o Deus Único não quer, nem precisa, que lhe paguemos o favor. Ele espera apenas que o dom da cura alcance o nosso coração e se traduza numa vida nova, no trilho de um caminho novo. A este respeito, a cena do Evangelho não podia ser mais clara. A gratidão do samaritano testemunhou que a ação de Jesus não lhe ficou à flor da pele, mas atingiu o seu coração e a sua vida e por isso segue Jesus e com Ele prossegue por um Caminho novo.
«Peço-te que aceites um presente deste teu servo»!
3.À luz desta Palavra e do lema pastoral «Abraça o presente. Juntos por um caminho novo», levemos a peito estes três desafios:
1.º Abraça os dons de Deus que Deus te confia! São um presente de Deus os dons da criação e da Vida, da família e da amizade, mas também os dons do Batismo, da fé e da vocação, os dons recebidos nos sete sacramentos. São um presente os dons da sabedoria e do conhecimento, as tuas qualidades pessoais. São ainda um presente de Deus os estrangeiros, com a riqueza da sua cultura, com as suas experiências e resiliências. Ora, a melhor maneira de honrar quem nos oferece tantos presentes, não é enjaulá-los, arquivá-los, guardá-los na gaveta. É usá-los, aplicá-los, investi-los, arriscá-los. Na verdade, “os dons de Deus são interativos e, para os desfrutar, é preciso pôr-se em campo, arriscar” (Christus vivit, 289). Abraça o presente, quer dizer, dá vida, uso e multiusos, a todos os dons que recebeste!
2.º Não vivas instalado, encadeado às desgraças ou glórias do passado.É preciso que te levantes, te ponhas a caminho, te aproximes e superes as distâncias. Lembra-te que Jesus ia a caminho e foi no caminho que os dez ficaram limpos da lepra. O samaritano levantou-se e seguiu Jesus, por um caminho novo. Abraça o presente, quer dizer, não copies as coisas do passado, sê criativo e fiel aos desafios de hoje. Tem a coragem de abrir e trilhar um caminho novo.
3.º Procura os outros nove. Hoje é Jesus que te pergunta: “Onde estão os outros nove?” (Lc 17,17). Em pleno outubro missionário, sai de ti e sai daqui à procura dos que receberam os dons do Batismo, do Crisma, da Eucaristia… e já não voltam, em cada domingo, para agradecer e louvar o Senhor, nesta Eucaristia. A prova dos nove da tua fé e da tua gratidão seja esta, neste mês: ofereceres de presente à tua comunidade um(a) irmã(o) que estava ausente. Trá-lo(a) e diz-me: «Peço-te que aceites um presente deste teu servo»! E podes ter esta certeza: todos abraçaremos, de coração agradecido, tão belo presente.