Homilia no XXIX Domingo Comum B 2021 | 1.º Esquema| Início do Sínodo
1. Levanta-te. Juntos por um caminho novo! Esta podia ser a resposta de Jesus a Tiago e a João, que se querem instalar e sentar um à direita e outro à esquerda de Jesus. Eles querem garantir um lugar de honra e majestade, tal é a sua ambição de poder e de domínio sobre os outros. Mas o caminho novo de Jesus é outro: é o caminho do dom e não do domínio; é o caminho do serviço ao outro e não do servir-se do outro; é o caminho em que cada um não procura um bom lugar para si, mas deseja tornar-se o melhor lugar para os outros. É, por isso, um caminho radicalmente diverso daquele por que correm os trepadores do poder; é um caminho não autorreferencial, de serviço e de vida dada e sacrificada pelos outros. Jesus sabe bem qual é a lógica dos grandes e dos chefes das nações: exercer o domínio e o poder sobre os outros. Nisto Jesus é perentório: não deve ser assim entre vós!
2. Não deve ser assim entre nós. Mas é-o tantas vezes, dentro desta Igreja que somos. É tão fácil e é tão comum reduzir a nossa vocação cristã a um estado de vida ou a um status social, em vez de fazer dela um caminho de seguimento de Jesus. É tão fácil e é tão comum confundir o serviço da autoridade e da unidade com o exercício do poder sobre os outros. É tão fácil e é tão comum, quer a leigos quer a clérigos, transformar qualquer ministério em lugar de honra e fazer da missão uma carreira. Uma das maiores perversões da Igreja, desde Tiago e João, que, aliás, contagiou também os outros dez, é precisamente esta do clericalismo, que anula a dignidade e a personalidade dos cristãos, diminui e subestima a graça batismal que o Espírito Santo pôs no coração do nosso povo e nega a voz e a participação ativa de todos os fiéis batizados na missão da Igreja. Com este clericalismo, a figura do ministro ordenado (diácono, padre ou bispo) é a de um príncipe, uma peça sagrada intocável, um membro da elite eclesiástica.
3. Expliquemo-nos melhor: há clericalismo quando um leigo diz «oSenhor Padre é que sabe» e se dispensa de dar o seu contributo próprio, como há clericalismo quando um Padre diz «eu é que sei; aqui quem manda sou eu», tornando-se o «patrão da barraca» e não o pastor de toda uma Igreja que está a caminho. Com este clericalismo, estamos a abrir caminho aos abusos de poder e a perverter a vontade de Cristo para a sua Igreja: «Não deve ser assim entre vós». Na Igreja, deve ouvir-se a voz de todos os fiéis; na Igreja deve brilhar a alegria do serviço humilde, a beleza da comunhão na diversidade de serviços e ministérios, a participação ativa de todos os fiéis na celebração e na edificação da comunidade, tendo sempre em vista a missão de anunciar e instaurar o reino de Cristo entre os irmãos e irmãs.
4.O Sínodo sobre a sinodalidade dá hoje os seus primeiros passos, a partir das Igrejas locais. Neste domingo, tem lugar, na Sé do Porto, a celebração inaugural do Sínodo. O desafio é agora o de aprendermos a caminhar juntos e não o de nos instalarmos nos assentos do poder ou do costume. O desafio é o de escutarmos juntos a Palavra de Deus e de nos escutarmos reciprocamente, para discernir a voz do Espírito. A sinodalidade parte do princípio de que, na Igreja, o que diz respeito a todos deve ser tratado por todos. Parte do princípio de que todo o povo santo de Deus é habitado, animado e guiado pelo Espírito Santo e goza, por isso, de uma espécie de sexto sentido da fé, que o torna infalível. O Sínodo, que começa por esta ampla auscultação, exige-nos uma mudança de software, uma conversão mental, espiritual e pastoral. Estamos, de facto, perante o maior acontecimento da Igreja, depois do 2.º Concílio do Vaticano. É preciso que não passemos ao lado.
5.Irmãos e irmãs: «Não é preciso fazer outra Igreja; é preciso fazer uma Igreja diferente» (Yves Congar). Este é o desafio. Por uma Igreja diferente, aberta à novidade que Deus lhe quer sugerir, invoquemos, neste especial tempo de graça, com mais força e frequência, o fogo e a luz do Espírito Santo.
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Nota: Esta oração de invocação do Espírito Santo, rezada pelo Papa Francisco, na conclusão da sua reflexão para o início do processo sinodal, pode ser proposta imediatamente no final da Homilia (como conclusão da mesma) ou em outro momento (conclusão da Oração dos Fiéis, Oração a seguir à Comunhão, etc.). Em todo o caso, pode ser proferida pelo Presidente ou por outro fiel batizado.
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Vinde, Espírito Santo!
Vós que suscitais línguas novas
e colocais nos lábios palavras de vida,
livrai-nos de nos tornarmos uma Igreja de museu,
bela mas muda, com tanto passado e pouco futuro.
Vinde estar connosco,
para que, na experiência sinodal,
não nos deixemos dominar pelo desencanto,
não debilitemos a profecia,
não acabemos por reduzir tudo
a discussões estéreis.
Vinde, Espírito Santo de Amor,
e abri os nossos corações para a escuta.
Vinde, Espírito de santidade,
e renovai o santo povo fiel de Deus.
Vinde, Espírito Criador,
e renovai a face da Terra.
Ámen.