HOMILIA NO XII DOMINGO COMUM B 2021 | FESTA DA ESPERANÇA
1.Esta bela e tremenda cena da tempestade acalmada traz-nos à mente aquele fim de tarde do dia 27 de março de 2020, quando o Papa Francisco, debaixo de uma chuva miudinha, atravessou sozinho a Praça de São Pedro, em plena explosão da pandemia, para nos fazer chegar à outra margem… A escolha deste Evangelho, para interpretar aquela hora dramática, deu voz à nossa esperança de que, apesar da tempestade, Deus continua a fazer germinar sementes de bem na humanidade. Demo-nos conta então de estarmos todos no mesmo barco, todos frágeis e desorientados, mas, ao mesmo tempo, todos importantes e necessários: todos chamados a remar juntos, todos carecidos de mútuo encorajamento. E, neste barco, ninguém se salva sozinho.
2.A tempestade provocada pela pandemia desmascarou a nossa fragilidade e pôs a descoberto as falsas seguranças com que construímos os nossos programas, os nossos projetos, os nossos hábitos de vida e prioridades. Com a tempestade, caiu a maquilhagem das ilusões com que mascaramos o nosso «eu» sempre preocupado com a própria imagem. Mas, ao mesmo tempo, com a tempestade pandémica, ficou a descoberto, uma vez mais, aquela abençoada pertença comum como irmãos. Com a tempestade vieram à tona da água os verdadeiros nadadores-salvadores desta geração: aquelas pessoas anónimas e escondidas, que se dedicaram a garantir os transportes, a segurança e os bens de consumo. Os nossos heróis são os professores, os profissionais de saúde (os médicos, enfermeiros…), na sua entrega até ao limite, capazes de sacrificar as suas vidas pelos outros. A tempestade fez assim emergir sinais de esperança, como foram, por exemplo, a redescoberta da casa e da família, o sentido vivo da comunidade, o despertar do voluntariado juvenil, o cuidado pelos mais idosos e a economia ao serviço das pessoas, o avanço científico…
3.Agora o Senhor interpela-nos a despertar e a ativar a esperança, não uma esperança ilusória, que se desfaz como a espuma das ondas, mas uma esperança ancorada na certeza de que Deus não nos abandona, de que Ele conduz a história, de que todas as coisas têm um sentido, independentemente de me correrem bem a mim ou não. Deus é capaz de tirar de muitos males um bem maior. Precisamos então desta esperança, que não é uma fuga para a frente, à espera de um mundo novo que cai do céu, sem trabalharmos por isso, mas também não é uma esperança que se contenta com o imediato. Não queremos nem um presente sem futuro, nem um futuro sem presente. O cristão espera os novos céus e a nova terra, a partir deste mundo que está nas suas mãos. Com a pandemia, podemos dizer que há todo um mundo velho que acaba e um mundo novo que começa. O caminho é seguir em frente, com a coragem de uma nova imaginação do possível, com o realismo que só o Evangelho nos dá. Não é tempo de voltar atrás: “As coisas antigas passaram; tudo foi renovado”!
4.Irmãos e irmãs: convidemos Jesus a subir para o barco da nossa vida. Confiemos-Lhe os nossos medos, para que Ele os vença. Graças ao amor de Deus, que impele a barca da história e da vida, podemos seguir em frente, sem medo de nos afogarmos. Temos uma âncora: na cruz de Cristo, fomos salvos. Temos um leme: na Sua cruz, fomos resgatados, para que nada e ninguém nos separe do Seu amor. No meio das tempestades da vida, lancemos a corda à âncora da esperança, que está presa ao Céu!
5.Somos um povo que está firme e de pé, como Maria, junto à Cruz; somos um povo que caminha na esperança. Não tenhamos medo de sair de nós mesmos e de nos pormos a caminho! Seja esta esperança a alavanca da vida de todos nós! Uma esperança que nos sustente sempre e até ao último respiro. Como Pedro, confiemos a Cristo todas as preocupações. Ele sempre cuida de nós (cf. 1 Pe 5, 7)!
Homilia no XII Domingo Comum B 2021 | Festa da Eucaristia (Primeira Comunhão)
Agora que a tempestade da pandemia parece estar a acalmar, destacaria três pontos essenciais na Liturgia da Palavra deste domingo, que nos podem ajudar a celebrar e a viver dignamente a Santa Eucaristia.
1.Em primeiro lugar, Jesus não nos abandonou no meio da tempestade! Talvez nos pareça que Ele está a dormir, que não quer saber de nós, que não Se importa com a nossa vida! Mas não! Jesus está presente, está atento, está connosco e até ao fim dos tempos. Ainda que pareça que a barca da vida, do mundo, da Igreja, está à deriva, sem controlo, Jesus continua à popa, isto é, Jesus está no lugar de comando da embarcação, como Senhor e guia. Mas a sua condução é tão secreta, tão discreta e suave, que quase nem nos damos conta desta Sua presença e guia. Mas Ele está connosco até ao fim dos tempos.
Podíamos ligar já este primeiro ponto à Eucaristia. Mesmo se, também aqui, Jesus nos parece ausente e distante, Ele está mesmo presente. Está presente através de mim, presidindo a esta Eucaristia, como outrora à popa da barca; Ele está presente nesta assembleia reunida em seu nome, convidada a entrar na barca da Igreja; Ele está presente na Palavra, que nos dá as coordenadas e nos orienta no percurso desta navegação difícil, como as estrelas aos navegantes; Ele está presente nos sinais humildes do pão e do vinho consagrados. Ele é “o Jesus escondido”, como Lhe chamava Francisco, o santo pastorinho de Fátima.
2.Em segundo lugar, esta presença ativa de Jesus é despertada pela fé. Jesus não Se impõe sem o nosso pedido, sem que chamemos por Ele. “Ainda não tendes fé?”, pergunta Jesus aos discípulos assustados! Só a fé permite acender as velas da barca, impelidas pelo sopro do Espírito Santo; só a fé nos permite despertar e reconhecer a presença do Senhor no meio de nós.
É assim também a presença de Jesus na Eucaristia: uma presença misteriosa, humilde, invisível aos nossos olhos. Nós não O vemos nem O conhecemos com os olhos da carne (cf. 2.ª leitura). Porque o nosso Deus é um Deus oculto, escondido por amor; não dá nas vistas, pelo que só O vemos e conhecemos na medida do amor d’Ele por nós e do nosso amor por Ele. Eis a razão por que, depois da consagração, o Presidente exclama: “Mistério da fé”. O essencial é invisível aos olhos. Só se vê bem com o coração, iluminado pela luz da fé.
3.Por último, vejamos como os discípulos perderam o medo, mas não o temor. Eles ficam de boca aberta, de coração cheio, maravilhados, espantados e diziam uns para os outros: “Quem é este homem, que até o vento e o mar Lhe obedecem?”. É uma atitude de espanto, de maravilhamento, de adoração e de louvor.
Também o milagre da presença oculta de Jesus na Eucaristia nos põe em adoração. Esta adoração manifesta-se quando se elevam a Hóstia e o Cálice com o Vinho e nós nos pomos de joelhos, em admiração, calados, sem dizer nada, cheios de espanto, perguntando lá no íntimo dos corações: Quem é este Jesus que Se entregou, morreu e ressuscitou por nós? Quem é este que Jesus que dá a Vida por mim, para que eu dê a minha vida pelos outros? Mesmo depois da Eucaristia, a presença de Jesus prolonga-se no sacrário. E aquela luzinha é como um semáforo, quando acende a luz vermelha e indica a cada um: Para junto a Mim; escuta-Me; olha para Mim que eu estou a olhar para ti! E então nós ficaremos com o coração sereno e em paz e poderemos dizer: “Se me colhe a tempestade e Jesus vai a dormir na minha barca, nada temo porque a Paz está comigo” (São João da Cruz).
Sim. Pela Eucaristia, mistério de fé e adoração, o Senhor está presente, está connosco todos os dias até ao fim dos tempos!