Homilia na Festa do Batismo do Senhor B 2021
1. É poderosa esta voz íntima do Amor do Pai que rasga os céus e ressoa no Batismo de Jesus, como um bálsamo de ternura! O Pai declara todo o Seu Amor por Jesus, a quem chama “Filho”. E chama-O num registo único, que está acima de quaisquer outros títulos de glória. “Tu és o meu Filho muito amado” (Mc 1,11) é a revelação máxima d’Aquele Amor pelo qual o Senhor tinha dito e predito do Seu Messias: “Tu és o meu servo, o meu eleito, enlevo da minha alma” (Is 42,1). E o que é mais belo é que o Filho muito amado do Pai não Se envergonha de nós pecadores: “O Autor da salvação não Se envergonha de nos chamar irmãos” (Heb 2,11)! Mostra-o claramente ao ser batizado por João, no rio Jordão: agindo deste modo, Jesus quer ser solidário com todos os pecadores, quer estar onde estão os pecadores.
2. O Batismo de Jesus é modelo para o nosso. No Batismo, é-nos dirigida também a nós a voz íntima do Pai, que pronuncia um nome novo para cada um de nós: “Tu és o meu Amado”. Entendemos este nome como nosso, não em virtude das nossas boas obras, mas porque Cristo, no Seu amor sem limites, deseja intensamente partilhar connosco a Sua relação filial com o Pai, para fazer de nós todos irmãos.
3. Batizados em nome do Pai, tornamo-nos todos filhos de Deus. Batizados em nome do Filho, tornamo-nos todos irmãos. Batizados em nome do Espírito Santo, tornamo-nos todos membros da família de Deus. Assim, no Batismo, radica a nossa igualdade fundamental. Pelo Batismo, reconhecemos em comum a nossa dignidade de pessoas criadas à imagem e semelhança de Deus; em comum a graça de filhos de Deus; em comum a pertença como membros de um mesmo Corpo; em comum a mesma vocação à santidade (cf. LG 32) e, em comum, a participação no único sacerdócio de Cristo e na missão da Igreja. Dignidade humana, filiação divina, incorporação na Igreja, vocação universal à santidade e à missão, dizem respeito igualmente a todos os batizados, sem exceção, porque “Deus não faz aceção de pessoas” (At 10,34). Batizados em Cristo, não há mais judeu nem grego, não há escravo nem livre, não há homem nem mulher; todos somos um só em Cristo Jesus (cf. Gl 3,26-28). N’Ele todo o homem é meu irmão, toda a mulher é minha irmã. N’Ele somos todos irmãos. Na Sua Igreja, somos todos de casa.
4. No Batismo, exprime-se e realiza-se, de modo radicalmente novo, o artigo 1.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que diz: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”. Pois é, mas esta fraternidade não brota espontânea de uma consciência razoável de partilharmos a mesma condição de criaturas ou de habitarmos a mesma Casa Comum. Esta fraternidade não resulta sequer de uma prática esforçada de equidade e de justiça social. “Tampouco se alcança a igualdade, definindo-se abstratamente que todos os seres humanos são iguais, mas esta [igualdade] resultará do cultivo consciente e pedagógico da fraternidade” (FT 104).
5. Ora, como havemos de cultivar esta fraternidade, como nos tornarmos irmãos? Deixo apenas um enunciado de sete sugestões, para nos educarmos na fraternidade:
§ Regressemos a Deus como Pai de todos nós. Porque quem ama o Pai, ama os filhos que o Pai ama. E quem ama os filhos, ama o Pai.
§ Reconheçamos que somos pouco fraternos e que isto de nos tornarmos irmãos exige um caminho de recuo de nós mesmos e de aceitação dos outros.
§ Façamos aos outros o que gostaríamos que nos fizessem a nós.
§ Estejamos plenamente disponíveis para acolher e escutar os outros.
§ Carreguemos com amor o peso da vida e os pecados, nossos e dos outros.
§ Perdoemo-nos uns aos outros, sempre e de todo o coração.
§ Unidos, colaboremos em alguma coisa para o bem comum.
Uma vez que somos todos irmãos (cf. Mt 23,8), peçamos a Deus que nos torne irmãos de todos, identificando-nos sobretudo com os últimos.
“Que Deus inspire este ideal a cada um de nós” (FT 287): Todos irmãos. Todos de casa!