Homilia no XVI Domingo Comum C 2019
«Marta, Marta, andasinquieta e preocupada com muitas coisas, quando uma só é necessária. Maria escolheu a melhorparte, que não lhe será tirada» (Lc 10, 41-42).
1. No seu afadigar-se e cansar-se, Marta corre o risco de esquecer o mais importante, ou seja, a presença do hóspede, que neste caso era Jesus. Esquece-se da presença do hóspede. E o hóspede não deve ser simplesmente servido, alimentado, cuidado de todos os modos. É necessário,sobretudo,que seja ouvido. Recordai-vos bem desta palavra: ouvir! Porque o hóspede deve ser acolhido como pessoa, com a sua história, com o seu coração rico de sentimentos e de pensamentos, de modo que se possa sentir deveras em família. Mas se tu acolheres um hóspede em tua casa e continuares a desempenhar as tuas tarefas, mandas que se sente ali, tu e ele calados, é como se fosse de pedra: o hóspede de pedra. Não. O hóspede deve ser ouvido. O mesmo se pode dizer, por exemplo, quando nos pomos a rezar. Se, por exemplo, diante do Crucifixo, falamos, falamos, falamos e depois vamos embora, não ouvimos Jesus! Não deixamos que Ele fale ao nosso coração. Não O recebemos como hóspede. Portanto, a primeira forma de acolhimento é ouvir, prestar atenção. Esta é uma palavra-chave para o verão: ouvir a voz de Deus nos silêncios e movimentos da Criação. Ouvir a voz de Deus na Palavra da Revelação. Ouvir a voz de Deus na história contada e partilhada do irmão. Trata-se de ser lugares-soleira, estar disponíveis para o inesperado, nas salas de espera, nas saídas da escola, nos centros comerciais, fora dos espaços paroquiais, à porta da nossa própria casa, para a escuta do coração.
2. Deste modo, a hospitalidade, que é uma das obras de misericórdia, parece ser deveras uma virtude humana e cristã, uma virtude que no mundo de hoje arrisca ser descuidada. Com efeito, multiplicam-se as casas de acolhimento e os lares, mas nem sempre nestes ambientes é praticada uma hospitalidade real. Até na própria casa, entre os familiares mais próximos, pode acontecer que se encontrem mais facilmente serviços e cuidados de vários géneros, em vez da escuta e do acolhimento. Por isso, o Papa lembra aos esposos esta prioridade: “Reservar tempo, tempo de qualidade, que permita escutar, com paciência e atenção, até que o outro tenha manifestado tudo o que precisava de comunicar. Isto requer o esforço de não começar a falar antes do momento apropriado. Em vez de começar a dar opiniões ou conselhos, é preciso assegurar-se de ter escutado tudo o que o outro tem necessidade de dizer. Isto implica fazer silêncio interior, para escutar sem ruídos no coração e na mente: despojar-se das pressas, pôr de lado as próprias necessidades e urgências, dar espaço. Muitas vezes,um dos esposos não precisa de uma solução para os seus problemas, mas de ser ouvido. Tem de sentir que alguém compreendeu a sua mágoa, a sua desilusão, o seu medo, a sua ira, a sua esperança, o seu sonho. Todavia é frequente ouvir estes queixumes: «Não me ouve. E quando parece que o faz, na realidade,está a pensar noutra coisa». «Falo-lhe e tenho a sensação de que está à espera que acabe depressa». «Quando lhe falo, tenta mudar de assunto ou dá-me respostas rápidas para encerrar a conversa»” (AL 137). O mesmo se podia dizer em relação aos filhos, aos avós.
3. Nestes dias, sentemo-nos um pouco a rodar o pensamento do nosso coração à volta destas perguntas: «Tu, marido, tens tempo para ouvir a tua esposa? E tu, esposa, tens tempo para ouvir o teu marido? Vós, pais, «perdeis» tempo a ouvir os vossos filhos? Tendes tempo, em família, para ouvir a sabedoria dos vossos avós»? Peço-vos que aprendais, neste verão, a ouvir e a dedicar mais tempo à escuta. Na capacidade da escuta está a raiz da paz. A primeira coisa que possamos dizer a quem de nós se abeira seja esta: «Senta-te aí; sou todo(a)ouvidos, para ti».
Nota: Homilia inspirada, em boa parte, no texto do comentário do Papa Francisco, na oração do Angelus, 17.07.2016